O Pastor Sesóstris Cé­sar Souza nasceu no ser­tão do Ceará, em 1915, e aceitou a mensagem adventista aos 20 anos, quando era gerente de um cinema no Rio de Janeiro. Foi batizado no dia 6 de outubro de 1936, indo, no ano seguinte, colportar na cidade de Belém, PA, onde conseguiu seu primeiro estipêndio para dar início aos estudos no anti­ go Colégio Adventista Brasileiro, hoje IAE.

Formou-se em Teologia no ano de 1942 e foi atuar como missionário no Amazonas, durante a Segunda Guerra Mundial. Traba­lhou em Manaus, Belém do Pará e São Luís do Maranhão, de onde foi chamado para o IPAE, como professor de português e latim. Posteriormente, foi pastor em Recife, Passo Fundo, Porto Alegre, Curitiba, São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro.

O Pastor Sesóstris também trabalhou como preceptor, diretor do 1ACS, departa­mental J.A., de Educação, e também de Co­municação. Seu último local de trabalho foi a igreja de Botafogo, no Rio de Janeiro, onde se aposentou em 1976. Casado com a irmã Lily Souza, possui duas filhas – a Pro­fessora Rute, casada com o Dr. Natanael Costa, e a Professora Irenilda, casada com o Professor Eliseu Menegusso — e cinco ne­tos. Reside em Hortolândia, SP, onde falou à revista MINISTÉRIO.

MINISTÉRIO: Poderia dizer o momento e em que circunstâncias se sentiu chamado para o trabalho pastoral?

PASTOR SESÓSTRIS: Bem, isso foi resultado de uma série de fatores con­jugados. Logo após minha conversão, eu me senti bastante inspirado a dedicar-me à Causa de Deus. Fui colportar em Belém e, no final de um período de trabalho, o tesoureiro do Campo, Pastor Jorge Lobo, incentivou-me bastante a ir para o colégio adventista. Também contribuiu, e muito, o Pastor Moysés Nigri, quando era um jovem estudante. Eu estava entrando na Igreja Central do Rio de Janeiro, quando vi aquele jovem casal, ele e sua irmã. Perguntei quem eram e me disseram que eram estudantes do colégio. Fiquei impressiona­ do pela vida deles, a atividade na igreja, e isso me despertou a idéia de também estu­dar no colégio.

MINISTÉRIO: De todas as funções que ocupou na Obra adventista, qual a que lhe deu mais satisfação?

PASTOR SESÓSTRIS: Na realidade, não é muito fácil definir. Acima de tudo eu sou um pastor. Atuei como departamental, distrital e professor. Mas a satisfação sentida no ministério pastoral e no magistério foi imensa.

MINISTÉRIO: O senhor iniciou seu trabalho durante a Segunda Guerra Mundial. Como foi a experiência de trabalhar em tempo de guerra?

PASTOR SESÓSTRIS: Realmente foi um fato marcante. Mas era muito difícil. Eu estava no Amazonas e era uma época em que não havia nada, não tinha comida a não ser produtos da própria região. Muitas vezes os navios e aviões não conseguiam chegar até lá porque eram torpedeados. Aquele tempo de guerra era muito difícil. Tínhamos que viajar de navio à noite, com as luzes apagadas, com medo de torpedos. Esse foi um tempo de impacto para mim.

MINISTÉRIO: Segundo o seu modo dever, o que é um pastor de sucesso?


PASTOR SESÓSTRIS:
Somente a eter­nidade pode avaliar o verdadeiro êxito pas­toral. Nossos critérios humanos são limita­ dos. O Senhor é quem vê os verdadeiros motivos. Há, inclusive, resultados que só serão revelados no Céu. Mas, diante daquilo que é possível ver, se um pastor trabalha em comunhão com Cristo, conscientemente, ga­nhando almas e conservando-as na igreja, através de um trabalho de visitação e nutri­ção espiritual, esse é um pastor de sucesso. O resultado de sua dedicação será visto no envolvimento missionário da irmandade, no aumento de dízimos, freqüência aos cultos, expansão evangelística, etc. Galgar posições não é sinônimo de sucesso pastoral. Em algumas delas, o obreiro até encontra sua se­pultura intelectual.

MINISTÉRIO: O senhor aceitou todos os chamados que lhe foram feitos?

PASTOR SESÓSTRIS: Deixei de aceitar apenas um chamado. Não me lembro bem o porquê, mas depois, confesso que não me senti bem. Creio que, em tese, o obreiro deve aceitar os chamados que lhe chegam às mãos. Naturalmente, ele deve orar e buscar a evidência da vontade divina nesse sentido. Pode haver casos paradoxais como, por exemplo, um pastor de igreja ser chamado para lecionar Matemática não se sentindo um especialista na matéria. Mas a decisão deve ser tomada mediante fervorosa oração. Conheço muitos exemplos de obreiros que não aceitaram algum chamado e, posteriormente, não foram felizes. Mas essa é uma opinião particular.

MINISTÉRIO: Como o senhor vê o púl­pito adventista na atualidade?

PASTOR SESÓSTRIS: Para ser sincero, eu até me sinto constrangido ao falar desse assunto. Mas acho que muitas igrejas (não todas, evidentemente) estão sendo alimenta­ das com palha. O intelectualismo excessivo e uma programação departamentalizada são os responsáveis por isso. Muitos sermões são verdadeiras peças teológicas, mas as crianças, os adolescentes, alguns jovens e irmãos simples não entendem nada. Ou então apro­veita-se o sábado para promoção desse ou daquele departamento. A igreja não é alimentada. Não são pregados os grandes temas da Bíblia. Tenho saudade do tempo em que eu tremia de emoção, a igreja vibrava, ouvin­do sobre esses temas. Claro, tudo deve ter um enfoque cristocêntrico. Pastor, o púlpito é, numa linguagem simples, um cocho onde o rebanho vai comer e beber. Ele deve ser posto também ao alcance dos cordeirinhos. Todo o rebanho deve ter suas necessidades satisfeitas através de uma mensagem essencialmente bíblica. A igreja está faminta do Pão da Vida e da Água da Vida.

MINISTÉRIO: Há diferenças marcantes entre os obreiros de ontem e os de hoje?

PASTOR SESÓSTRIS: Bem, naquele tempo os obreiros saíam do colégio, de trem ou de navio. Hoje, eles saem de carro, de avião. Eu, por exemplo, quando saí do colé­gio, levei toda a minha bagagem numa mala (e a minha esposa ainda diz que eu coloquei um travesseiro dentro para acabar de en­cher). As condições eram bem diferentes das que temos hoje.

Naquele época, não havia casa para mo­rar e nem carro; era muito difícil a vida dos primeiros obreiros. Hoje, as condições de vida são muito mais avançadas, mais sofisti­cadas. Naquele tempo, a gente não tinha o preparo, aquela luz que se tem hoje. Para fazer evangelismo, não tínhamos projetores, filmes, videocassete, nem material para as crianças; tudo era muito primitivo. Hoje é mais fácil evangelizar.

MINISTÉRIO: Como obreiro jubilado, o senhor se considera devidamente assistido pela Associação Ministerial?

PASTOR SESÓSTRIS: De um modo geral, sim. Mas nunca veio alguém de nenhum nível da Organização fazer-me uma visita pastoral. Acho que um representante da As­sociação Ministerial deveria visitar os obrei­ros aposentados. Alguns estão doentes, outros sentem falta daquele convívio ministerial. Faz bem sentir que alguém ainda se preocupa conosco.

MINISTÉRIO: Para algumas pessoas, a aposentadoria é incômoda. Sentem-se rele­gadas ao ostracismo, ou algo semelhante. Qual seu sentimento em relação a isso?

PASTOR SESÓSTRIS: A aposentadoria não significou o fim do trabalho para mim. Continuo participando nas atividades da igreja, pregando, dirigindo semanas de oração, oficiando casamentos, etc. Em maio, realizei uma abençoada Semana de Oração no Centro Educacional Tancredo Neves, em São João Del Rei, MG, um internato da Gol­den Cross. Durante cada noite, um aluno to­mava a decisão de aceitar a Cristo. Batizei sete alunos no último dia. Oito atenderam ao apelo e se preparam para um próximo batismo. Não parei. Nem estou insatisfeito.

MINISTÉRIO: O senhor gosta de trabalhar com crianças. Qual o segredo para al­cançá-las?

PASTOR SESÓSTRIS: Quando estou na igreja, vejo dezenas de crianças dormindo na hora do sermão. Às vezes os pastores co­ locam o cocho tão alto que os cordeiros do rebanho não o alcançam. As crianças não entendem os sermões intelectuais, eruditos; ou aqueles que só trazem promoção departa­mental. Nem sempre os pregadores têm “pão” para as crianças. Então, ficam muitas delas “morrendo de fome” na igreja, criando problemas, dormindo ou se mexendo, in­ quietas. Há anos que venho trabalhando com as crianças, pregando para elas, realizando semanas de oração, tudo de maneira simples, ao nível delas. Tudo isso porque acho que, se as crianças de hoje não forem bem alimentadas, quando atingirem a adolescência, acabarão deixando a igreja.

MINISTÉRIO: Quais os resultados des­se trabalho?

PASTOR SESÓSTRIS: Atualmente eu cuido dos lares infantis mantidos pela Gol­den Cross. São quase vinte lares, com mais de 400 crianças, espalhados pelo Brasil. Elas entram nesses lares, aos 16 anos vão para o colégio como semi-bolsistas, cursam o primeiro e segundo graus e ingressam numa fa­culdade qualquer. Tenho 98 meninas em fa­culdades e internatos adventistas. Várias es- tão fazendo cursos de pós-graduação, algumas até já se formaram, duas trabalham no Exterior, outras conseguiram bons casamen­tos. Esta é a minha alegria: receber crianças saídas do nada, carentes, oriundas de lares desmantelados, órfãs, e prepará-las para a vida.

MINISTÉRIO: O senhor se sente reali­zado?

PASTOR SESÓSTRIS: Não. Depois de 34 anos servindo à Obra e 20 trabalhando na Golden, ainda há algo para fazer. Quero mul­tiplicar os lares infantis em todo o Brasil, ver o meu livro publicado, entre outras coisas.

MINISTÉRIO: Por falar em livro, como surgiu a idéia de publicar um e qual o seu conteúdo?

PASTOR SESÓSTRIS: O livro, a ser lan­çado pela Casa Publicadora Brasileira, é sobre o ministério dos anjos. São experiências interessantes sobre a atuação dos anjos na vida de muitas pessoas e, evidentemente, as lições que podemos tirar disso tudo. Curiosa­ mente, mais uma vez fui inspirado pelo Pastor Nigri. Ao ver seu livro Meditações Mati­nais, do ano passado, senti o desejo de fazer algo em tomo do ministério dos anjos. Não poderia ser um livro de meditações, pois se- ria difícil catalogar 365 experiências. A su- gestão da CASA foi no sentido de que escre­vesse simplesmente um livro. Creio que bre­vemente estará à disposição do público.

MINISTÉRIO: Como o senhor vê a Igreja Adventista, quase 150 após o início desse movimento?

PASTOR SESÓSTRIS: Sem dúvida houve muitas lutas e delas resultaram algumas mudanças, ao longo dos anos. Alguns padrões de comportamento mantidos no passa­ do, já não são os mesmos de hoje. A Igreja cresceu muito, administrar a estrutura atual tomou-se algo complexo. A atenção à pessoa humana, noutras palavras, a atenção pessoal ao membro da Igreja cedeu lugar à preocupação institucional. Esse é um grande perigo. Mas, a mão de Deus está ao leme. Tudo acabará bem.

MINISTÉRIO: O senhor acha que a Igreja está cumprindo fielmente seu papel missionário?

PASTOR SESÓSTRIS: Apesar de todas as dificuldades, está. O plano Missão Global foi a melhor coisa que apareceu. Ele mudou realmente muita coisa. A mensagem adventista está penetrando em lugares antigamente fechadíssimos, portas estão se abrindo mila­grosamente, enfim, há uma mobilização de

forças e setores que eu não vi antes. A igreja está vibrando.

MINISTÉRIO: Mesmo assim, ainda há uma considerável parcela de membros que não se envolve.

PASTOR SESÓSTRIS: Isso nunca foi fácil mesmo. A questão é que muitos membros não se sentem capacitados para determinado tipo de serviço que lhes é soli­citado fazer. Nesse caso, os pastores e a liderança em geral devem tomar tempo para ajudar os membros a descobrirem seus dons, capacitá-los e prover material para o trabalho. Há outros casos em que o problema tal­ vez seja a falta de uma experiência mais só­ lida de conversão. Devemos trabalhar e orar em favor desses. O Espírito Santo despertará e utilizará a todos quantos se submeterem ao Seu poder.

MINISTÉRIO: Que fator o senhor vê como representando uma ameaça à doutrina da Igreja Adventista?

PASTOR SESÓSTRIS: Primeiramente quero lembrar que temos um corpo doutriná­rio fundamentado na Bíblia. Assim sendo, eu creio que tudo aquilo que represente qualquer ameaça pode ser enfrentado com o “assim diz o Senhor”.

O meu temor, às vezes, é que muitos membros pouco instruídos nas grandes ver­dades bíblicas, acabem sucumbindo a um vendaval que surja, como por exemplo, o ocultismo, o carismatismo que cresce assustadoramente, e de modo especial o Movimento Nova Era. Esses movimentos, a qual- quer hora, podem apresentar falsos cristos, fazendo milagres, prodígios, e maravilhas, e, para mim, muitos dentre o nosso povo não estão preparados para receber um choque desse tipo, pela razão que já mencionei antes: falta de alimento sólido do púlpito e, acrescento agora, falta de leitura das obras do Espírito de Profecia.

Se o povo lesse a Bíblia e o Espírito de Profecia estaria preparado para o que acon­tecerá nos últimos dias da História. Mas muita gente vai ficar confusa e ser enganada porque não lê. Creio que essa é a maior ameaça.

MINISTÉRIO: Qual a doutrina adventista que mais lhe fala ao coração?

PASTOR SESÓSTRIS: Dentre todas as doutrinas da Igreja, a que mais me cativa, comove, e fala profundamente à minha alma, é a pré-existência de Cristo e Sua eternidade, a encarnação. Impressiona-me como Cristo deixou a Sua glória, tomou a forma humana e veio viver entre os homens. É o mistério da piedade. Eu não sei entender isso em toda a sua plenitude. Como a divindade envolveu-Se com a hu­manidade e vice-versa, é algo além da nossa compreensão. E lhe digo que se Cristo não tivesse vindo como veio, revelando o Pai, talvez seria muito difícil eu crer em um Deus distante, inacessível a mim. Ele trouxe Deus para perto de mim, para perto de nós. Isso é a coisa mais maravilhosa da Bíblia.

MINISTÉRIO: De acordo com o seu modo de ver, qual a maior necessidade da Igreja atualmente?

PASTOR SESÓSTRIS: A Igreja precisa retomar ao primeiro amor, tal como adverte o Apocalipse. Ao lado disso, outra coisa me preocupa: É preciso haver um despertamen­to para a realidade que Jesus logo vem. Mui- tos irmãos estão vivendo despreocupados, indiferentes a essa verdade, construindo e ajuntando para este mundo. A febre do consumismo tem contagiado a muitos dentro da igreja, como se a volta de Cristo fosse uma realidade distante, ou até nem fosse aconte­cer. Precisamos vencer o egoísmo, dividir o pão com o faminto e necessitado, precisa­ mos ver além das aquisições terrenas. Jesus está vindo, e essa deveria ser a nossa preo­cupação maior.

MINISTÉRIO: Um recado especial para os leitores de MINISTÉRIO.

PASTOR SESÓSTRIS: Eu diria, espe­cialmente aos pastores e anciãos, que ali­ mentem bem o rebanho que Deus lhes con­fiou. Não o deixem faminto, tampouco colo­ quem palha no cocho. Coloquem-no ao alcance dos cordeirinhos também. O rebanho bem nutrido ficará feliz, pronto e disposto para trabalhar. Sendo bem assistidos em suas necessidades, o irmãos responderão com naturalidade à missão.

Planejem bons programas evangelísticos para as noites de domingo. Tanto os membros batizados como os visitantes rece­berão os benefícios de uma apresentação cristocêntrica das doutrinas. Não podemos deixar de alimentar o povo, através de men­sagens essencialmente bíblicas.