Atitudes simples podem promover o bem-estar mental
A Igreja Adventista do Sétimo Dia tem como uma de suas crenças distintivas a observância de princípios que levam à vida saudável. Contudo, é interessante notar que, no início da denominação, seus ministros foram um tanto quanto resistentes à aplicação desses conselhos inspirados em sua vida.1
Ainda hoje é relativamente comum encontrar pastores que são bons em aconselhar outros sobre saúde, mas, de certa forma, resistentes na hora de praticar em sua própria vida os mesmos princípios compartilhados. Talvez isso se deva ao fato de que os ministros se sintam invulneráveis, em virtude de estarem no serviço do Senhor.
No entanto, a realidade é que nós, pastores, somos seres humanos e, como tais, vulneráveis. O apóstolo Paulo disse ter um “espinho na carne” (2Co 12:7), provavelmente referindo-se a uma visão limitada. Por que, então, não poderíamos ter um espinho na mente? Os ministros não estão imunes à doença, incluindo aquelas que afetam a psique e requerem tratamento profissional.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde, até 2020, nas regiões mais desenvolvidas, a depressão se tornará a principal causa de enfermidade, ao lado de doenças coronárias e acidentes de trânsito, e será o segundo principal motivo de invalidez.2
A maioria dos adventistas pode explicar facilmente quais são os oito remédios naturais apresentados por Ellen White.3 Entre eles, o que tem maior projeção no campo da saúde mental é a confiança em Deus. Entretanto, esse não é o único que a autora sugere para esse aspecto. Quais são os outros?
Ela apresenta no livro A Ciência do Bom Viver outros três remédios (dos quais pouco falamos) que, além de contribuir com o bem-estar mental, também afetam positivamente a saúde física geral. Diz a escritora: “Gratidão, regozijo, benignidade, confiança no amor e no cuidado de Deus — eis as maiores salvaguardas da saúde.”4
É interessante notar que o conselho de Ellen White é comprovado pela ciência da saúde mental, especialmente pelo movimento psicoterapêutico denominado Psicologia Positiva. Essa corrente contrasta com as terapias tradicionais, que tratam principalmente das questões relacionadas às carências humanas e sua possível reparação, como depressão, estresse, ansiedade, vícios, suicídio, entre outros transtornos.
Quem promove a psicologia positiva explica: “A psicologia do século 21 deveria se preocupar não apenas em reparar o dano psicológico, mas também em estudar como são reforçadas as qualidades positivas que todos os seres humanos possuem.”5 Devemos acrescentar que esse reforço pode ser maravilhosamente acompanhado pelo trabalho eficaz do Espírito Santo. Vejamos os efeitos positivos que esses quatro remédios podem promover em nossa saúde física e mental.
Gratidão
Em meio à crise econômica global, as pessoas tendem a valorizar mais os laços pessoais do que os aspectos materiais. Nesse contexto, a gratidão contribui para que isso ocorra. O fato é que nossa qualidade de vida será maior à medida que nossos relacionamentos forem mais sólidos.
Os pastores precisam estabelecer boas relações. Os irmãos que nos apoiam nas atividades da igreja não recebem remuneração por seu trabalho. Por isso, gostam quando seu esforço é apreciado e reconhecido. O espírito de gratidão manifesto pelo pastor gera um clima positivo, que estimula o empenho dos voluntários e promove o desenvolvimento das diversas atividades da congregação local.
Ellen White resume o efeito da gratidão na saúde quando diz: “Coisa alguma tende mais a promover a saúde do corpo e da alma do que o espírito de gratidão e louvor.” 6 Podemos nos perguntar: Como a gratidão pode ajudar nossa saúde? Quanto a isso, devemos destacar que tem sido possível provar cientificamente que pessoas gratas tendem a experimentar emoções positivas como contentamento, alegria e esperança com muito mais frequência do que pessoas ingratas.7 Essa qualidade pode gerar um ambiente positivo que alimenta a pessoa grata, melhorando sua saúde física e emocional.
Alegria
Ao longo do tempo, pesquisadores descobriram que a tão procurada felicidade não se encontra, mas se constrói. Somos capazes de criá-la; portanto, ela depende de nós. Eles também provaram que pessoas felizes não são aquelas que não têm problemas, mas aquelas que podem lidar com os reveses e seguir em frente, com a ajuda de Deus.
Após extensa pesquisa, Sonja Lyubomirsky tentou identificar as causas do bem-estar e da felicidade. Seu trabalho constatou que 50% das causas estão ligadas a aspectos determinados geneticamente.8 Apenas 10% dos níveis de felicidade que alcançamos estão relacionados às diferentes circunstâncias experimentadas. Para provar isso, a pesquisadora cita um estudo feito nos Estados Unidos, no qual se demonstrou que os empresários americanos relataram níveis de felicidade pessoal pouco maiores do que o de seus funcionários.
A constatação de que as circunstâncias da vida têm pouca relevância para nosso bem-estar e não constituem a chave para nossa felicidade nos encoraja a buscá-la por nós mesmos!
De fato, se fôssemos gêmeos idênticos e tivéssemos vivido as mesmas circunstâncias de vida, diz Sonja, diferiríamos em nível de felicidade. Sua pesquisa constatou que há um terceiro fator por trás de nossa capacidade de ser feliz: a atitude. Ela se reflete na nossa maneira de pensar e em nossas atividades cotidianas. Esse fator é valioso porque nos permite decidir e exercer controle total sobre nossa felicidade. Não há nada que possamos fazer quanto à herança genética. Não temos o domínio completo das circunstâncias da vida; contudo, temos o controle de nossas atitudes. Ou seja, 40% das causas do bem-estar e da felicidade estão em nossas mãos!
Vemos em declarações de Ellen White um reflexo dessa mesma posição. Para a escritora, alegria e felicidade são resultado da atitude pessoal: “Por meio de Cristo podemos e devemos ser felizes e adquirir hábitos de domínio próprio.”9 À primeira vista, a declaração chama a atenção porque temos a ideia de que a felicidade não pode ser enquadrada como um dever, pois ela aparece somente de acordo com as condições. Como, então, podemos nos obrigar a ser felizes?
Ellen White afirma que podemos dirigir nossos pensamentos. Além das circunstâncias em torno de nós, temos a opção de conduzir o rumo do que pensamos a respeito do que nos acontece e de como interpretamos os fatos. Quantas vezes você se deparou com um membro da igreja que tende a pensar negativamente de quase tudo, enquanto outro prefere destacar as coisas positivas, mesmo em tempos difíceis? E quanto a nós? Não somos a exceção! Podemos manter atitudes que, de alguma forma, predeterminam nossa interpretação da realidade.
Além disso, a escritora agrega um benefício adicional ao associar a alegria com a saúde integral: “Devemos incentivar alegre, esperançosa e tranquila disposição de espírito; pois nossa saúde depende de fazermos isso.” Que desafio!
Bondade
Em uma das matérias que lecionamos na Faculdade de Teologia temos um requisito no qual os alunos são desafiados a preparar e desenvolver um projeto comunitário. Quando lhes perguntamos quais foram os resultados do trabalho, invariavelmente a grande maioria responde que eles foram os principais beneficiados. Os alunos enfatizam como se sentiram bem ao experimentar esse fruto do Espírito, ao realizar uma atividade solidária.
Foi Hans Selye10 que estabeleceu o conceito de “egoísmo altruísta”. Essa ideia consiste na seguinte dinâmica: procuramos fazer o bem aos outros a fim de que os outros nos devolvam o bem. Desse modo, geramos em torno de nós um ambiente positivo e saudável. Na prática, contudo, as coisas não ocorrem de maneira tão exata. De fato, o bem deve ser feito, em princípio, sem esperar nada em troca. A benevolência demonstrada deve ser um resultado da bondade recebida do Senhor, que se reflete no ensino da parábola dos dois devedores: “Você não devia ter tido misericórdia do seu conservo como eu tive de você?” (Mt 18:33, NVI).
Confiança no amor e no cuidado de Deus
Ter a confiança e a certeza de que nossa vida descansa nas mãos de um Deus que nos ama contribui significativamente para o desenvolvimento da paz interior tão necessária. Essa paz é muito valiosa, porque não depende das circunstâncias que nos rodeiam, que podem ser inquietantes, mas de uma experiência interior que torna eficaz a expressão paulina: “Todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus” (Rm 8:28). A partir dessa perspectiva, tem sentido o provérbio: “Alimente sua fé em Deus, e seus medos vão morrer de fome.”
Dicas para desenvolver as quatro atitudes no dia a dia |
Gratidão | Como parte de sua devoção pessoal, leia o livro dos Salmos e faça uma lista de motivos pelos quais você deve ser grato a Deus. Durante um mês, todos os dias, mostre gratidão a alguém por algo que essa pessoa tenha feito de especial a você. |
Alegria | Consiga uma boa versão do clássico “O Messias”, de Handel, e, durante uma semana, ouça-a no início do dia com fones de ouvido. Imagine o momento da segunda vinda de Jesus, no qual você reencontrará seus entes queridos e as pessoas que levou a Cristo. |
Bondade | Escolha uma família carente da igreja e ajude-a, seja pagando a mensalidade da Escola Adventista para um de seus filhos ou dando-lhe uma cesta básica pelo tempo que você decidir. Dedique algumas horas por semana para acompanhar alguém doente ou algum idoso que vive sozinho. |
Confiança em Deus | Pense em três coisas que deram certo no último mês. Pergunte a si mesmo como Deus interveio nessas situações, e quais emoções e sentimentos isso desperta em você. Faça um inventário das bênçãos que Deus derramou sobre sua família e seu ministério nos últimos cinco anos. Planeje uma reunião para celebrar essas dádivas, de modo que todos se alegrem pelas grandes coisas que o Senhor realizou por vocês. |
Talvez tenha havido alguns momentos ao longo de nosso ministério nos quais sentimos que a situação pela qual passávamos era totalmente injusta: uma transferência inesperada, acontecimentos nos quais percebemos duvidosas intenções, enfim, circunstâncias que nos afetaram negativamente. Entretanto, como é gratificante, depois de algum tempo, olhar para trás e ver como o Senhor nos guiou através desses aparentes vales obscuros, permitindo-nos passar por extraordinárias experiências espirituais! Em alguns casos, podemos até considerar esses momentos entre os mais felizes de nossa vida.
Conclusão
Na sociedade confusa em que vivemos, podemos pensar que a solução para nossos problemas deve ter estas duas características: sofisticação e complexidade. Essa talvez seja uma das razões pelas quais julgamos ser tão difícil aplicar os princípios divinos para desfrutar de excelente saúde física e mental. Entretanto, sabemos por experiência própria que o conselho de Deus aplicado à nossa vida sempre produz o efeito prometido. Que o Senhor nos ajude a ser fiéis ouvintes e praticantes de suas orientações, a fim de que possamos desfrutar de uma vida mais plena e feliz!
Referências
- 1 Herbert Douglass, Mensageira do Senhor (Tatuí, SP: CPB, 2001), p. 295.
- 2 Organização Mundial de Saúde, Informe sobre la Salud em el Mundo – 2001, <http://www.who.int>.
- 3 Ellen G. White, A Ciência do Bom Viver (Tatuí, SP: CPB, 1997), p. 89.
- 4 Ibid, p. 214
- 5 M. Seligman e M. Csikszentmihalyi, “Positive Psychology: An Introduction”, American Psychologist, 55 (1), 5-14.
- 6 Ellen G. White, A Ciência do Bom Viver, p. 194.
- 7 R. A. Emmons e M. E. McCullough, “Counting Blessings versus Burdens: An Experimental Investigation of Gratitude and Subjective
Well-being in Daily Life”, Journal of Personality
and Social Psychology, v. 84, p. 377-389. - 8 S. Lyubomirsky, La Ciencia de la Felicidad: Un Método Probado para Conseguir el Bienestar (Barcelona: Ediciones Urano, 2008).
- 9 Ellen G. White, Mente, Caráter e Personalidade (Tatuí, SP: CPB, 1989), v. 2, p. 593.
- 10 Médico nacionalizado canadense que, a partir de suas investigações, descobriu o estresse e seus efeitos na saúde humana.