Carlos Chimpén e Soledad Sagrado
Conflitos devem ser resolvidos com o objetivo de melhorar os relacionamentos e com a disposição de ver o mundo em todas as suas dimensões, não apenas com “nossos óculos”.
por Wellington Barbosa
Compreender a dinâmica do conflito a partir de diferentes perspectivas é uma necessidade para pessoas que precisam lidar com ele no dia a dia. O casal de professores universitários Carlos Chimpén Lopez e Soledad Sagrado García decidiram se aprofundar nesse conhecimento e, nesta entrevista, compartilhar um pouco de sua experiência.
Carlos Chimpén López é doutor em Psicologia e mestre em Psicoterapia pela Universidade de Salamanca, Espanha. Além disso, obteve um mestrado em Terapia Narrativa pela Universidade de Melbourne, Austrália. Atualmente, trabalha como professor na Universidade de Extremadura, onde é diretor do único mestrado espanhol em terapia narrativa. Ele é sócio-fundador e presidente da Associação Espanhola de Terapia Narrativa (Aeten).
A esposa, Soledad Sagrado García, é assistente social e mestre em Mediação Social e Intercultural pela Universidade de Sevilha, Espanha. Atualmente, é professora de Formação Profissional nos ciclos de Integração Social, Atenção às Pessoas em Situação de Dependência e Educação Infantil. Ela é secretária e sócia-fundadora da Aeten.
Eles são casados há quase 25 anos e têm dois filhos jovens, Daniel e Loida, que são a motivação de tudo o que fazem e o maior êxito que obtiveram em nível pessoal e profissional.
Quais são os tipos mais comuns de conflito?
Em uma sociedade tão plural quanto a nossa, repleta de mudanças tanto nos modelos familiares quanto nas estruturas sociais, não acreditamos que os conflitos possam ser reduzidos a um único tipo. No entanto, podemos afirmar que os conflitos familiares, em qualquer um dos novos modelos existentes (famílias monoparentais, reconstituídas, extensas, entre outras) são os que mais afetam pessoas, devido ao alto grau de envolvimento emocional que eles implicam.
Que tipo de conflito é mais difícil de resolver? Por quê?
Em nossa opinião, não há conflito mais difícil de resolver do que outro. Há pessoas que passam por situações que as impedem de desenvolver estratégias bem-sucedidas de resolução de conflitos e, portanto, têm maior dificuldade em resolvê-los. O importante é destacar que, quanto mais enraizado e fortalecido for um conflito, mais difícil será sua resolução. Os conflitos relacionados às pessoas com quem temos laços emocionais profundos são mais complexos de se lidar, uma vez que os sentimentos fazem parte do conflito e o condicionam. Também é importante ter em mente que é possível desenvolver a habilidade para resolver conflitos, e que a sociedade tem responsabilidade quanto a isso. Devemos ensinar às crianças as melhores formas de resolver conflitos desde os primeiros momentos da infância.
Todo conflito é prejudicial? Se não, como um conflito pode ser positivo?
É muito importante entender que conflitos não têm que ser negativos, aliás, que eles não são negativos em si mesmos. A base para sua resolução é enxergá-los como algo positivo que nos proporciona oportunidades de aperfeiçoamento, crescimento pessoal e social e reconstrução de situações negativas. Conflitos não são ruins em si mesmos; a nossa maneira de os gerenciarmos é o que lhes dá caráter negativo. Além disso, os conflitos foram e são necessários no processo das maiores mudanças da história da humanidade.
Não queremos dizer com isso que temos que passar a vida “procurando” conflitos, mas precisamos aprender a gerenciá-los e resolvê-los positivamente desde cedo, a fim de tirar o máximo proveito deles. Por exemplo, estar com raiva de uma pessoa ou se sentir mal com ela não é algo negativo; o problema é gerenciar o sentimento de forma violenta ou agressiva. A raiva, quando bem administrada, nos ajuda a conhecer a nós mesmos e a entender o outro. Ao conseguir lidar adequadamente com o sentimento, encontra-se uma forma alternativa de resolver conflitos, eliminando seu caráter negativo.
Quais são os principais desafios ao administrar um conflito?
O principal desafio na resolução de qualquer conflito tem que ver com a crença de que todo conflito é negativo. As mudanças mais significativas ocorrem quando vemos conflitos como possibilidades. Outro elemento importante é a empatia, entendida aqui não como “colocar-se no lugar do outro”, mas como uma forma de valorizar e respeitar o outro como pessoa, ainda que seja muito diferente de nós. Dessa maneira, poderíamos entender a empatia como o abandono do egocentrismo que nos faz ver os outros como diferentes e piores do que nós. Ver o outro como igual e não como rival muda a forma de administrar qualquer conflito.
Os senhores são especialistas em mediação. Como esse método de resolução de conflitos pode ser definido?
A mediação é um método que se provou eficaz na resolução de conflitos em áreas tão diversas como conflitos trabalhistas, conjugais, familiares, ambientais e comunitários, entre outros. É importante não confundir mediação com outros instrumentos, como a negociação, arbitragem e a conciliação, que é amplamente usada pelos pastores nas igrejas.
Podemos definir mediação como um método alternativo de resolução de conflitos, em que uma terceira pessoa, imparcial, neutra e com ferramentas profissionais, ajuda as partes a chegar a um acordo em que ambas ganham. Em uma mediação, os envolvidos sabem mais sobre seu conflito, a respeito de como e quando ele se originou e de como foi alimentado e fortalecido. Por isso, eles estão comprometidos com a resolução do conflito e dispostos a alcançar um acordo satisfatório, em que as partes têm que ceder.
É importante entender que o mediador não direciona nem decide nem aconselha, apenas ouve atentamente e coloca em prática seu conhecimento para conseguir que as partes cheguem a um acordo em que ambas ganhem. A mediação é uma ferramenta muito eficaz, mas ao mesmo tempo é um instrumento profissional que requer treinamento e preparação por parte das pessoas que serão mediadoras.
Alguns pastores ignoram os problemas, pensando em evitar os conflitos. Essa estratégia é válida? Quais são as principais consequências desse tipo de comportamento?
Evitar ou ignorar um problema é uma forma negativa e ineficaz de administrá-lo, mas é bastante comum. Ao longo da vida aprendemos a agir assim por ver muitas pessoas gerindo conflitos desse modo. O importante é entender que, com tal atitude, os problemas não desaparecem; ao contrário, só crescem e atingem cada vez mais profundamente as pessoas.
Administrar conflitos dessa maneira provoca nas pessoas frustração, sentimentos de impotência e pode levar a comportamentos agressivos. Elas também podem perder a confiança em si mesmas, apresentar problemas de autoestima e ter mais dificuldade em confiar em outras pessoas ou figuras representativas para elas, como os pastores.
Qual é a melhor forma de resolver conflitos?
Não existe um caminho único para resolver conflitos, o importante é remover a carga da negatividade sobre eles e proporcionar às pessoas experiências positivas ao enfrentar uma situação conflitiva. No entanto, acreditamos ser muito importante valorizar a diversidade de opiniões, culturas, valores, pensamentos e comportamentos. Além disso, é preciso ver aqueles que são diferentes de nós como pessoas que somam, contribuem e ajudam no processo, não vê-los como inimigos.
Conflitos devem ser resolvidos com o objetivo de melhorar os relacionamentos e com adisposição de ver o mundo em todas as suas dimensões, não apenas com “nossos óculos”. A melhor maneira de resolvê-los é fazer isso com a intenção de ajudar o outro e a mim mesmo a crescer como pessoa e melhorar o relacionamento no presente e no futuro, não com o propósito de “ganhar” do outro nem feri-lo. É preciso ver o conflito sob um ponto de vista relacional, deixando de lado o individualismo.
Como desenvolver uma cultura de igreja que minimize os conflitos e maximize um ambiente harmônico?
Essa pergunta é difícil de responder, porque não há duas igrejas iguais e não existe uma fórmula mágica que possa ser aplicada em todos os conflitos. Correndo o risco de parecer repetitivo, acreditamos que a única maneira de minimizar os conflitos é respeitar os outros como pessoas diferentes, abandonar ideias preconcebidas em relação aos demais e ter como meta o respeito ao próximo e a si mesmo. Mais uma vez, o relacionamento tem grande importância. As igrejas são estruturas formadas por pessoas com formas muito diferentes de pensar, o que torna os conflitos inevitáveis em seu ambiente. Por isso, é importante ensinarmos às crianças desde cedo a gerenciá-los de maneira positiva e entendê-los como algo que nos ajuda em nosso crescimento como pessoas e como igreja. Como em tantas outras coisas, a prevenção é a melhor estratégia para buscar a harmonia em nossas congregações.