Jesus incendiou o mundo. Onde está esse fogo hoje?
Jesus disse: “Eu vim para lançar fogo sobre a Terra” (Luc. 12:49). E Ele o fez. Toda vez que curou, sempre que ensinou, toda vez que expulsou um demônio lançou Ele fogo sobre a Terra. Ele ateou fogo em vilas e corações. Era perigoso encontrar-se com Jesus; Ele era incendiário.
A obra de lançar fogo está intimamente ligada com o Espírito Santo. João Batista disse que Jesus batizaria “com o Espírito Santo e com fogo” (Mat. 3:11). Essa promessa se cumpriu literalmente no Pentecostes, quando o Espírito Santo veio sobre os discípulos: “E apareceram, distribuídas entre eles, línguas como de fogo; e pousou sobre cada um deles. Todos ficaram cheios do Espírito Santo” (Atos 2:3 e 4).
Quando os discípulos receberam o Espírito Santo, o fogo que Jesus viera lançar sobre a Terra foi ateado. O livro de Atos parece retratar toda a igreja do Novo Testamento em chamas, cada cristão testemunhando do salvador domínio de Cristo, a igreja crescendo aos saltos e pulos, sinais e milagres por toda parte, o fogo sagrado passando de pessoa para pessoa. “Acrescentava-lhes o Senhor, dia a dia, os que iam sendo salvos” (Atos 2:47), e o mundo foi virado de cabeça para baixo.
E agora uma pergunta: Onde está o fogo? Jesus estava em chamas; os apóstolos foram inflamados no Pentecostes; a igreja primitiva ardeu ofuscantemente. Onde está o fogo hoje?
A meu ver, a igreja de Jesus Cristo necessita de uma renovação. Poucas congregações, grandes ou pequenas, de qualquer denominação, poderiam provar com facilidade a alegação de estar em chama. No presente clima, os tições incandescentes passam por fogueiras, as espirais de fumaça por conflagrações. E quando atentamos para Deus, ouvimo-Lo chorando — chorando porque o fogo aceso por Seu sangue foi abafado pela indiferença.
“Conheço as tuas obras, que nem és frio nem quente. Quem dera fosses frio, ou quente! Assim, porque és morno, e nem és quente nem frio, estou a ponto de vomitar-te da Minha boca; pois dizes: Estou rico e abastado, e não preciso de coisa alguma, e nem sabes que tu és infeliz, sim, miserável, pobre, cego e nu” (Apoc. 3:15-17).
Com certeza, nós, adventistas do sétimo dia, não deveriamos surpreender-nos com um apelo para reavivamento. Cem anos atrás, Ellen White escreveu: “Um reavivamento da verdadeira piedade entre nós, eis a maior e a mais urgente de todas as nossas necessidades. Buscá-lo, deve ser nossa primeira ocupação.”1
Lamento dizê-lo, mas não posso perceber que tenhamos ouvido o conselho; não temos tornado a busca do reavivamento nossa primeira ocupação. O evangelismo pode ser nossa primeira ocupação, ou talvez a preservação institucional, mas não a busca do reavivamento. Ao menos parece. Somos muitas coisas, mas não somos um povo “espiritual”. Também não somos povo “natural” — não convertido, não regenerado. A designação que melhor se presta é “carnal”. Paulo diz que as pessoas carnais necessitam de leite, em lugar de alimento sólido, pois são imaturas. Elas não são “naturais”, embora vivam como pessoas comuns (I Cor. 2:14-3:4).
A igreja: obstáculo à fé?
Acreditamos que a igreja, ao invés de ser o instrumento de salvação que Deus pretendia que fosse, tornou-Se o maior obstáculo à fé. De maneiras diversas, tem-se ouvido os que não são cristãos dizerem: “Jesus, sim; a igreja, não.” Ao ser dito que a cristandade não trabalha, G. K. Chesterton discordou. Disse ele: “Ainda não foi comprovado.” Alguém ouviu um hindu dizer: “Eu me tornaria cristão se pudesse ver um.”
Em lugar de “Avante, Soldados Cristãos”, devíamos cantar:
Como uma grande tartaruga, move-se a igreja de Deus.
Irmãos, estamos andando onde já pisamos.
Estamos todos divididos, somos muitas corporações.
Muito fortes em doutrina, fracos em caridade.
Bem fazemos em alimentar a casca das pessoas — a casca da teologia e da moralidade — mas não somos muito bons para dar-lhes o alimento para sua alma. A pregação atingiu uma condição inferior. Já não somos o povo do Livro. A verdadeira oração é quase desconhecida entre nós. Raramente se percebe o prazer do Senhor.
Temos confundido religiosidade com espiritualidade, sem perceber que a religiosidade não é senão uma pobre, superficial e pálida paródia de ombros curvados da espiritualidade.
“Há perigo de dependermos dos nossos próprios esforços, em lugar de permitir que o Espírito Santo realize a obra; mas a Igreja continua sendo de Cristo”.
“Tendo começado no Espírito, (estais) agora vos aperfeiçoando na carne?” (Gál. 3:3). Nos dias de Paulo, a questão consistia em saber se os gálatas, em lugar de continuarem a depender somente de Cris-to para a salvação, procuravam acrescentar suas realizações, na vã esperança de que ao assim fazerem poderiam tornar mais certa sua salvação. Era uma mudança da centralização em Deus para a centralização no homem.
Em nossos dias, um novo perigo cresce junto com o perigo antigo — a tentativa de substituir a dependência do Espírito Santo pela dependência do esforço e habilidade humanos, de abandonar a nossa fé de que a igreja é de Cristo e confiar nos esforços humanos para divulgá-la. Ninguém que lê a respeito do início, seja da igreja do Novo Testamento ou da Igreja Adventista do Sétimo Dia, duvidará de que elas começaram com o Espírito. Termiraremos pela carne?
Convém lembrarmos que o Espírito Santo não habita em planos, programas, projetos ou promoções; habita nas pessoas. Ele não unge o maquinário, mas as pessoas.
Carl Bates disse certa vez: “Se o Espírito Santo fosse retirado subitamente da Terra, 90 por cento do que a igreja realiza não mais seria correto.’’ Temo que ele esteja certo. Temo que já não sejamos um povo espiritual. Deveriamos orar em lugar de planejar. Esperar no Senhor, em lugar de trabalhar. Deveríamos ser ministros, em lugar de gerentes. Vemos a igreja mais como uma empresa do que como uma irmandade. Vemos o pastor mais como um diretor-executivo do que como apascentador. (Por que os pastores se tornam administradores, mas os administradores raramente se tornam pastores?) Pensamos na organização como uma hierarquia de autoridade, ao invés de como uma comunidade de colegas de trabalho todos os quais são irmãos e irmãs.
Outrora, nossas instituições foram aparelhadas para realizar nossa missão no mundo; agora, porém, a manutenção de nossas instituições é nossa missão no mundo. Elas se tornaram a cauda que abana o cachorro. Para manter nossas instituições, estamos esvaindo nossas congregações locais, e temos dificuldade de conceber qualquer ministério separado das instituições.
Há muito pouca confiança entre nós. Temos medo de expressar nossas opiniões. Porque não confiamos uns nos outros, construímos elaborados sistemas de cheques e balanças para estar certos de que ninguém pode roubar a igreja. Muitos de nós desconfiam grandemente de que a igreja funciona de acordo com o sistema do “tudo bem”. Quando a igreja se reúne para tratar de negócios, usam-se técnicas maquiavélicas para conseguir o resultado previamente determinado. A liderança não está interessada nas pessoas a serviço das quais se supõe que ela esteja. A prestatividade se transformou em autocracia. Sabemos bem pouco a respeito da “força na fraqueza” e da “morte para o eu”.
Temo que tendo começado pelo Espírito, estejamos terminando pela carne.
Que podemos fazer?
Que podemos fazer? Podemos arrepender-nos, podemos orar. Ellen White disse: “Nosso Pai celeste está mais disposto a dar Seu Espírito Santo àqueles que Lho peçam, do que pais terrenos o estão a dar boas dádivas a seus filhos. Cumpre-nos, porém, mediante confissão, humilhação, arrependimento e fervorosa oração, cumprir as condições estipuladas por Deus em Sua promessa para conceder-nos Sua bênção. Só podemos esperar um reavivamento em resposta à oração.”1 1 2
Gastamos muito tempo procurando ser fortes e em dominar-nos, porque não compreendemos que o Seu poder “se aperfeiçoa na fraqueza”. Estamos tão ocupados, lutando por nós mesmos, nossos pontos de vista, nossos planos — tão ocupados, provando que sabemos o que é certo para a igreja — que somos incapazes de avaliar as irregularidades. A confissão e o arrependimento são palavras que não têm som muito agradável para nós. Humilhação é a última coisa que desejamos. Contudo, não podemos experimentar reavivamento sem eles.
Cumpre-nos ser determinados acima de tudo, para que sejamos líderes espirituais. Precisamos abrir espaço para Deus em nossa vida, assim como Ele abriu espaço para nós em Seu concerto de família. Devemos aquietar-nos diante dEle e prestar atenção à Sua voz mansa. Precisamos dar o primeiro lugar em nossas agendas à prática das disciplinas espirituais, que por vinte séculos foram a espinha dorsal da liderança da igreja.
Cumpre lembrar-nos — constantemente — de que esta é a igreja de Cristo e de que Ele não precisa de nós. Devemos lembrar-nos de que Ele não nos chamou para ser bem-sucedidos, mas para ser fiéis. Devemos lembrar-nos de que ser é mais importante do que fazer.
Se o ministério não pode ou não quer servir de modelo de tais convicções, on-de pode o fogo ser reacendido? Oremos uns pelos outros, para sermos pessoas espirituais. Oremos para que o fogo que Jesus lançou sobre a Terra possa arder sempre — dentro de nós.