Para 53% das pessoas que participaram de uma pesquisa da revista Época, os pastores evangélicos não são confiáveis. Acredito que esses entrevistados avaliaram de forma generalizada, influenciados pelo que a própria mídia divulga (e nesse caso ela enfatiza mesmo o negativo) a respeito de pastores envolvidos na política, ou que fundaram e administram igrejas que se tornaram impérios econômicos, pela comercialização da fé.
Porém, quando somos focalizados por refletores alheios, uma atitude sensata é a de, primeiramente, nos entregarmos a uma reflexão autocrítica. Que razões levariam o povo a desacreditar num ministro do evangelho de Jesus Cristo? Essa é uma intrigante questão. Quero acreditar que sejam poucas. Mas acho que entre elas estão o pragmatismo e o exacerbado profissionalismo. Ambos podem deixar o rebanho à mercê de suas próprias carências insatisfeitas, o que faz surgirem o desalento e o descrédito.
Da vida profissional secular, é fácil entender que existem basicamente duas maneiras de tratar com rebanhos. Uma é aquela exemplificada pelo trabalho de um vaqueiro. A outra maneira é vista na atividade de pastorear ovelhas, muito comum nas regiões orientais. É verdade que entre os dois tipos há também o magarefe. Mas por sua ação fria, sanguinária e cruel, recuso-me a ver nele algum paralelo com o pastoreio espiritual. Ele existe simplesmente para matar o rebanho.
Não se pode dizer que o vaqueiro não cuide do rebanho. Ele o conduz, pela manhã, às pastagens, tocando-o com um grito aqui, uma estocada de vara ali, uma chicotada acolá. Às vezes, embora esteja com o rebanho, parece indiferente a ele. Deixa-o solto ao longo do pasto, onde pode comer, beber e descansar, a seu bel-prazer, por sua própria conta. O vaqueiro tem outras coisas “mais importantes” para fazer. No fim da tarde, reúne os animais e os leva de volta para o abrigo. A obrigação está cumprida. Sabe que precisa alimentá-los bem e abrigá-los dos perigos e intempéries, tendo em vista a matança, quando poderá auferir vantajosos lucros pessoais. Tudo muito pragmático e profissional. Mas insuficiente, quando pensamos no pastoreio espiritual.
Embora seja de uma espécie que não costuma viver em rebanhos, o meu fiel cão repete para mim, todos os dias, a lição de que os animais irracionais “querem” e precisam de algo mais que ração e abrigo. Basta ver como ele se oferece para acompanhar-me nas caminhadas, me convida para brincar, e, às vezes, somente come a ração quando um de nós da família permanece ao seu lado. Em suma, parece carecer de atenção, simpatia e empatia. Que diríamos então dos seres humanos, que com suas necessidades emocionais e espirituais, compõem o redil do Senhor? É aqui que o pastor difere do vaqueiro. O pastor alimenta e abriga o rebanho, dando-lhe algo mais, com carinho e ternura paternais.
A Bíblia descreve belamente a obra do pastor, no Salmo 23. Jesus Se identificou como um pastor: “Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida pelas ovelhas” (João 10:11), e isso diz tudo o que caracteriza o verdadeiro pastor, o que o torna confiável e o que o faz desacreditado: amor, doação de si mesmo pelo rebanho. Não apenas doação de algo ao rebanho, para obtenção de ganhos pessoais ou mero cumprimento de uma obrigação profissional. Roy Allan Anderson, no livro O Pastor Evangelista, descreve o pastor como guia, atalaia, provedor, médico e salvador do rebanho.
E Ellen White assegura: “O espírito do verdadeiro pastor é de inteiro esquecimento de si mesmo. Ele perde de vista o eu para que possa fazer as obras de Deus. Pela pregação e pelo ministério pessoal nos lares do povo, toma conhecimento de suas necessidades, tristezas e provas; e, cooperando com Aquele que leva o maior fardo, participa das aflições deles, conforta-os em seus dissabores, farta-lhes a alma faminta e salva-lhes o coração para Deus. Nesta obra é o ministro assistido pelos anjos do Céu, sendo ele próprio instruído e iluminado na verdade que o torna sábio para a salvação.” – Atos dos Apóstolos, pág. 527.
O rebanho de Deus não precisa apenas de vaqueiros, pragmáticos e bons profissionais, diligentes empregados de uma Organização, que o tratem simplesmente como instrumento para conquistar metas. O rebanho de Deus necessita de pastores no sentido mais amplo e profundo do termo. Pastores que o amem: que revelem sincera e natural empatia; que considerem as necessidades e feridas da sua alma; sim, pastores sempre acessíveis e presentes. A esses o rebanho responde com amor e confiança. – Zinaldo A. Santos.