Sermão proferido por ocasião de uma cerimônia de ordenação de médicos, em Belém, PA.
Era o ocaso, o anoitecer, do Antigo Testamento. O seu último escritor, o profeta Malaquias, cujo nome significa “Meu Mensageiro”, deve ter exercido seu trabalho por volta do ano 425 a.C., período em que profetizou sobre o advento de Cristo, Seu ministério e Sua obra. “Mas para vós outros que temeis o Meu nome nascerá o Sol da Justiça, trazendo salvação nas Suas asas;…” (Mal. 4:2).
A palavra traduzida por “salvação”, aqui nesse verso bíblico, vem do vocábulo hebraico rapa, que quer dizer “cura”, “restauração à prosperidade”, “restauração em sentido espiritual”, “fazer integral”, “restauração à totalidade do ser”, “salvação”.
Quatro séculos e meio depois da profecia de Malaquias, o Senhor Jesus Cristo iniciou o Seu ministério terrestre.
A ênfase do ministério de Cristo
O ministério exercido por Jesus Cristo abordava todas as áreas nas quais a Sua Igreja atua hoje. “E percorria Jesus todas as cidades e povoados, ensinando nas sinagogas, pregando o evangelho do reino e curando toda sorte de doenças e enfermidades.” (Mat. 9:35). Notemos os termos “ensinando”, “pregando” e “curando”. Justamente por isso, o Senhor Jesus podia dizer “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância.” (João 10:10).
E Ellen White assegura: “Durante Seu ministério Jesus dedicou mais tempo a curar os enfermos do que a pregar. … Ao passar por vilas e cidades, era como uma corrente vivificadora, difundindo vida e alegria.” – A Ciência do Bom Viver, págs. 19 e 20.
A ênfase de Cristo no ministério da cura, da restauração, na obra médico-missionária, era tão grande que ao enviar os doze apóstolos deu-lhes as seguintes orientações: “E, à medida que seguirdes, pregai que está próximo o reino dos Céus. Curai enfermos, ressuscitai mortos, purificai leprosos, expeli demônios; de graça recebestes, de graça dai.” (Mat. 10:7 e 8). Após a Sua ressurreição, ao dar as últimas instruções aos discípulos, enfatizou: “Se impuserem as mãos sobre enfermos, eles ficarão curados.” (Marcos 16:18).
A importância de qualquer assunto reside no valor que Cristo dá a esse assunto. E saúde era fator importante na vida e ministério do Senhor Jesus. Não é possível haver religião se não valorizamos aquilo que Cristo valoriza. E o Salvador valorizou intensamente a saúde, a cura, a restauração física e espiritual. Valorizou a obra médico-missionária evangelística.
“As palavras do Senhor: ’Vinde a Mim … e Eu vos aliviarei, são uma receita para as curas dos males físicos, mentais e espirituais.” – A Ciência do Bom Viver, pág. 115.
Cristo Jesus foi o grande médico evangelista. Aliás, segundo o Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, médico é “aquele que está habilitado a evitar, curar ou atenuar as doenças. Aquilo que pode restabelecer a saúde física ou moral”.
O médico na Bíblia
A palavra “médico” aparece 13 vezes na Bíblia, sendo seis vezes no Velho Testamento, e sete vezes no Novo Testamento. Das sete vezes em que ela aparece no Novo Testamento, seis estão nos três primeiros Evangelhos, sendo uma vez em Mateus, duas em Marcos e três em Lucas. Todas as referências estão relacionadas com o ministério e Obra de Cristo.
A sétima vez em que a palavra “médico” aparece no Novo Testamento, que também é a última, é para identificar um médico pelo seu nome: “Saúda-vos Lucas, o médico amado.” (Col. 4:14).
Lucas, provavelmente, é abreviatura de Lucanus (natural da Lucânia, província meridional da Itália), e significa “Terra de Luz, luz, luminoso, luzente, iluminado”. Excelentes características para um médico cristão. O Dr. Lucas é mencionado pelo nome três vezes, todas elas citadas pelo apóstolo Paulo. A primeira vez está no mencionado texto da Carta aos Colossenses. A companhia de Lucas para o apóstolo Paulo era sempre um motivo de consolo e fortaleza; pois como médico-missionário uniu-se ao ministério pastoral, formando um só ministério em Cristo. Provavelmente, Lucas assistia também a Paulo, devido à saúde precária desse apóstolo.
A segunda vez em que o nome Lucas é encontrado está em Filemom 24, onde é incluído entre os cooperadores do apóstolo. Paulo chama de cooperadores todos quantos trabalhavam juntamente com ele pela mesma causa evangelística. E ali está o médico-missionário Lucas, cooperando na tarefa de pregar o evangelho. O Dr. Lucas tinha convicção do seu chamado, de sua vocação e missão. A prova disso está em Atos 16:10: “… imediatamente procuramos partir para aquele destino, concluindo que Deus nos havia chamado para lhes anunciar o evangelho.” Ele também foi cooperador do apóstolo Paulo, ao escrever o Evangelho que leva o seu nome, e no qual apresenta a Cristo como um Salvador universal, um grande e compassivo médico, que viera aliviar os sofrimentos humanos e salvar o que se havia perdido. O médico amado escreveu também o livro de Atos, única narrativa disponível da história eclesiástica dos tempos apostólicos. Por tudo isso, Paulo o tinha como um cooperador valioso.
Na Igreja Remanescente, obra médico-missionária e ministério evangélico devem e precisam estar unidos, sob a direção divina, no trabalho de preparar o caminho para a vinda de Cristo.
Uma terceira vez o nome Lucas aparece na Bíblia, quando Paulo afirma: “Só Lucas está comigo.” (II Tim. 4:11).
“Os poucos amigos que haviam compartilhado dos trabalhos do apóstolo Paulo começavam agora a abandoná-lo; alguns por deserção, outros em missão a várias igrejas. Fígelo e Hermógenes foram os primeiros a sair. Então Demas, descoroçoado pelas densas nuvens de dificuldades e perigos, abandonou o perseguido apóstolo. Crescente foi enviado por Paulo às igrejas da Galácia; Tito à Dalmácia, Tíquico a Éfeso.
“Escrevendo a Timóteo sobre esta experiência final do seu ministério, Paulo disse: ’Só Lucas está comigo’ … Os serviços de Lucas, discípulo amado e fiel amigo, foram um grande conforto para Paulo, permitindo-lhe comunicar-se com seus irmãos e o mundo exterior.” – Atos dos Apóstolos, pág. 490.
O possível constrangimento que representava o encarceramento de Paulo não acovardou ou intimidou o Dr. Lucas. Sua profissão, como médico, poderia ter-lhe proporcionado prestígio e riqueza, porém Lucas estimou como uma honra superior o acompanhar a Paulo na sua hora de sofrimento, até que a guilhotina do malfazejo e cruel imperador Nero silenciou a voz do apóstolo dos gentios, Paulo de Tarso.
Vimos um médico-missionário Jesus Cristo, em ação, valorizando a saúde e a obra médico-missionária. Também vimos o Dr. Lucas, o médico-missionário amado e cooperador na Igreja nascente, convicto do seu chamado e de sua vocação. Mas, onde está situada a obra médico-missionária na Igreja Remanescente?
Obra médico-missionária hoje
Vi outro anjo voando pelo meio do Céu, tendo um evangelho eterno para pregar aos que se assentam sobre a Terra, e a cada nação, e tribo, e língua e povo.” (Apoc. 14:6).
O evangelho eterno é o evangelho de Jesus. Inclui a Obra de Cristo que era a de ensinar, pregar e curar. Afirma Ellen White: “Na providência do Senhor posso ver que a obra médico-missionária deve ser uma grande cunha de penetração por meio da qual a alma enferma pode ser alcançada.” – Conselhos Sobre Saúde, pág. 535. E mais: “Devem os médicos lembrar-se de que muitas vezes serão convocados para realizar os deveres de um pastor. Os médicos missionários vêm sob o título de evangelistas.” Medicina e Salvação, pág. 249.
“A obra médico-missionária deve estar ligada com o ministério evangélico … Nenhuma linha deve ser traçada entre o genuíno trabalho médico-missionário e o ministério evangélico. Os dois devem ser misturados. Não devem permanecer à parte, cada um deles como um setor separado da Obra. Devem estar associados em inseparável união, assim como a mão está ligada ao corpo.” – Idem, págs. 240 e 250.
E, finalmente, vem o texto que nos impulsionou para esta cerimônia de ordenação, escrito em 1908: “A obra do verdadeiro médico-missionário é em grande parte uma obra espiritual. Inclui oração e o impor das mãos; portanto ele deve ser separado para sua obra de maneira tão sagrada como o ministro do evangelho. Os que são escolhidos para desempenhar a parte de médicos-missionários devem ser separados como tais.” – Evangelismo, pág. 546.
Qualidade indispensável
O que é necessário para ser um verdadeiro médico missionário? O mesmo Senhor Jesus Cristo responde: “Sem Mim, nada podeis fazer.” (João 15:5). “O maior médico é aquele que anda nas pegadas de Jesus Cristo”, diz Ellen White, em Conselhos Sobre Saúde, pág. 544.
Andar nas pegadas de Jesus é dizer como Ele: “Eu não vim fazer a Minha própria vontade, mas a vontade dAquele que Me enviou.” (João 6:38).
Andar nas pegadas de Jesus é estar disposto a ir às mais longínquas “cidades e vilas pregando o evangelho do reino, ensinando … e curando toda sorte de doenças e enfermidades”.
Andar nas pegadas de Jesus é assegurar como o próprio Cristo: “Eu não vim para ser servido, mas para servir e dar a Minha vida em resgate por muitos.” (Marcos 10:45).
Andar nas pegadas de Jesus é ter “o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois Ele, subsistindo em forma de Deus não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes a Si mesmo Se esvaziou, assumindo a forma de servo, tomando-Se em semelhança de homens… a Si mesmo Se humilhou tortnando-Se obediente até à morte, e morte de cruz.” (Fil. 2:5 a 8).
Andar nas pegadas de Jesus é ter a segurança e a convicção do Senhor Jesus, ao dizer: “O Espírito do Senhor é sobre Mim, pois que Me ungiu para evangelizar os pobres, enviou-Me a curar os quebrantados do coração, a apregoar liberdade aos cativos, e dar vista aos cegos, a pôr em liberdade os oprimidos; e anunciar o ano aceitável do Senhor.” (Lucas 4:18 e 19).
Solene desafio
Cristo Jesus foi o exemplo maior na obra médico-missionária-evangelística: pregando, ensinando e curando nas cidades e povoados.
Lucas, o médico amado, o luzente, o iluminado, uniu-se ao apóstolo Paulo como um grande cooperador no pioneirismo missionário e esteve ao lado de Paulo até o martírio deste.
Na Igreja Remanescente, obra médico-missionária e ministério evangélico devem e precisam estar unidos, sob a direção divina, no trabalho de preparar o caminho para a vinda de Cristo. Para isso, pastores e médicos-missionários devem ser verdadeiramente cristãos, seguindo as pegadas de Jesus Cristo e recebendo sobre si o Espírito do Senhor para evangelizar, curar e anunciar o ano aceitável do Senhor.
“Mas para vós outros que temeis o Meu nome nascerá o Sol da Justiça, trazendo salvação nas Suas asas.”
Deus abençoe os médicos ordenandos, para que nas pegadas de Jesus e no poder do Espírito Santo possam verdadeiramente ser obreiros de Deus, servos de Deus, médicos missionários de Cristo, embaixadores do reino eterno, ordenados e separados do Senhor, e pelo Senhor, a fim de cooperarem decisivamente para a conclusão da Obra de Deus na Terra, abreviando o desejado e apoteótico encontro com Cristo, a Esperança da Glória, o Sol da Justiça, a resplandecente Estrela da Manhã.