Dr. Léo R. Van Dolson Diretor associado do Depto, da Escola Sabatina da Associação Geral. Diretor das Lições da Escola Sabatina dos Adultos
A doutrina bíblica da saúde não é uma simples questão marginal que podemos aceitar ou rejeitar. Visto que o Céu nos impressiona e se comunica conosco por meio do mecanismo físico dos nervos do cérebro (Testimonies, vol. 2, pág. 347), o bem-estar espiritual requer que o corpo, o qual abriga a mente e exerce tanta influência sobre a sua condição, seja mantido tão livre quanto for possível dos resultados de hábitos que destroem a saúde.
O homem foi criado originalmente à imagem de Deus — física, mental e espiritualmente (Gên. 1:26 e 27; Educação, págs. 15 e 20). Quando Adão e Eva caíram em pecado, as consequências envolveram todo aspecto da imagem de Deus. Não somente veio a morte sobre a raça humana, mas os seres humanos começaram a degenerar-se “em sua estatura e resistência física, e em sua faculdade moral e intelectual” (Patriarcas e Profetas, pág. 63). O plano da salvação foi estabelecido para “restaurar no homem a imagem de seu Autor, levá-lo de novo à perfeição em que fora criado, promover o desenvolvimento do corpo, espírito e alma para que se pudesse realizar o propósito divino da sua criação” (Educação, pág. 16).
Alguns encaram o processo da salvação como uma espécie de competição cósmica, na qual Deus atua como registrador de pontos. A salvação torna-se, então, uma simples questão de Cristo morrer na cruz como nosso substituto, decidindo completamente a questão em nosso favor. Isso, em parte, pode ser verdade, mas Deus é muito mais do que honrado registrador de pontos. O plano da salvação não se destina meramente para decidir competições, e, sim, para restaurar a imagem de Deus nos seres humanos.
Jesus não somente é Senhor, mas deve ser o Senhor de tudo que temos e somos — Senhor em todos os aspectos de nossa vida. Ele tem de ser um Salvador completo. O que perdemos no princípio, devido ao pecado, deve ser restaurado da máxima maneira possível nesta vida, por meio de Jesus. Às vezes olvidamos que fazemos parte do mais sensacional e excitante acontecimento que o mundo já viu — a terminação da obra de Deus na Terra por intermédio de seres humanos que O amam o suficiente para submeter a vida completamente a Ele.
No sentido mais restrito, a mensagem do evangelho pode limitar-se às boas-novas de que Cristo experimentou a morte que era nossa para que pudéssemos desfrutar Sua vida. Contudo, os adventistas reconhecem que em sua plenitude ela se torna as boas-novas de que Deus, por meio de Cristo, restaurou e continua restaurando tudo que foi perdido por causa do pecado. Atribuímos especial significação ao “evangelho eterno” sob o aspecto das mensagens dos três anjos de Apocalipse 14:6-12. Descobrimos aí que Deus pretende demonstrar a prática operação do evangelho por meio da vida de Seus santos, “os que guardam os mandamentos de Deus e a fé em Jesus” (verso 12), mesmo em meio da revolta final de Babilônia.
Essa restauração ocorre fisicamente, bem como espiritualmente. Falando a esse respeito, Ellen White declara: “O Salvador assistia tanto à alma como ao corpo. O evangelho por Ele pregado era uma mensagem de vida espiritual e de restauração física. O libertamento do pecado e a cura da doença estavam ligados entre si.” — A Ciência do Bom Viver, pág. 110. Será que devemos ensinar um evangelho diferente daquele que Cristo ensinou?
A serva do Senhor recomenda vigorosamente que unamos a reforma de saúde, que ela chama de “evangelho da saúde” com o resto da mensagem do evangelho. “Os princípios da reforma de saúde encontram-se na Palavra de Deus. O evangelho da saúde deve estar firmemente associado com o ministério da Palavra. É desígnio do Senhor que a influência restauradora da reforma de saúde seja parte do último grande esforço para proclamar a mensagem do evangelho.” — Medicina e Salvação, pág. 259. A própria comissão evangélica, portanto, abrange a saúde e a cura, conforme é declarado em A Ciência do Bom Viver, pág. 141: “A cura física está ligada à incumbência evangélica. Na obra do evangelho, o ensino e a cura nunca se devem separar.” (Grifo acrescentado.)
Parte das Mensagens dos Três Anjos
A mensagem da saúde não somente “está ligada à incumbência evangélica”, mas encontra-se entre as principais doutrinas ensinadas por esta Igreja. Pode mesmo ser considerada uma parte definida das mensagens dos três anjos. O livro Conselhos Sobre Saúde, na página 49, declara inequivocamente que “a reforma de saúde é parte importante da mensagem do terceiro anjo”. Separar a doutrina da saúde da doutrina do juízo investigativo, dos 2.300 dias, do santuário, da segunda vinda de Cristo, do milênio e do sábado pode ser comparado ao ato de separar do corpo o braço direito. No entanto, a mensagem da saúde não deve tornar-se nosso assunto todo-absorvente.
Ela não é a tríplice mensagem angélica em sua totalidade. “A reforma de saúde está tão intimamente relacionada com a mensagem do terceiro anjo como o braço com o corpo; mas o braço não pode tomar o lugar do corpo…. A apresentação dos princípios de saúde deve estar unida com esta mensagem, mas não deve de maneira alguma ser independente dela ou ocupar o seu lugar.” — Carta 57, 1896; comparar com Testimonies, vol. 1, pág. 559; vol. 6, pág. 327.
O grande objetivo do evangelho da saúde, bem como a principal razão da forte ênfase que nós lhe damos, é sua posição no desenvolvimento do caráter cristão. Visto que o corpo e a alma não podem ser separados, a saúde é essencial à integridade, e a integridade constitui a chave do crescimento cristão. Em vez de ser um aspecto secundário relativamente pouco importante, que se pode aceitar ou rejeitar, nossa mensagem de saúde é um ingrediente fundamental no processo salutar, restaurador e transformador que constitui a base da pregação das mensagens dos três anjos.
O Templo do Espírito Santo
Não reconhecemos que nosso corpo é o templo do Espírito Santo meramente pelo senso do dever ou da responsabilidade. O prazer e a excitação de pertencer completamente a Deus e ser uma parte de Sua obra neste mundo enchem de tal maneira o nosso coração que acima de tudo o mais desejamos ser completamente dEle. Vivemos com o olhar voltado para a alegria de conhecer a plenitude de Sua presença quando Ele habita em nós por meio do Espírito Santo.
Jesus apresentou a figura do corpo como um templo na ocasião em que os judeus estavam desafiando o Seu direito de purificar o Templo de seus cambistas e aproveitadores. (Ver S. João 2:18-21).
Paulo ampliou a figura do corpo como templo de maneira surpreendente dizendo aos crentes de Corinto que o corpo desempenha uma parte significativa no divino plano da santificação. A filosofia grega tendia a depreciar o aspecto físico do homem, afirmando que a alma precisa desvencilhar-se da contaminação do corpo material. Paulo recusou aceitar esse conceito, mas retratou o corpo como um templo sagrado: “Acaso não sabeis que o vosso corpo é santuário do Espírito Santo que está em vós, o qual tendes da parte de Deus, e que não seis de vós mesmos? Porque fostes comprados por preço. Agora, pois, glorificai a Deus no vosso corpo [e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus].” I Coríntios 6:19 e 20.
A preocupação de Paulo nesta passagem não era principalmente a necessidade de saúde daqueles aos quais estava escrevendo, e, sim, as responsabilidades espirituais, as quais estão intimamente relacionadas com as paixões e os apetites. Sua ênfase nesse texto era a seguinte: “Não sois de vós mesmos.” Depois que aceitamos a salvação adquirida para nós pelo amoroso sacrifício de Cristo, não temos mais direito de usar as faculdades do corpo para finalidades egoístas e pecaminosas do que para usar o dízimo dessa maneira. Deus deve ser glorificado em todo o uso das faculdades físicas.
Ellen White expressa esta mesma preocupação: “Muitos parecem pensar que têm o direito de tratar o seu próprio corpo como lhes apraz, mas se esquecem de que seu corpo não é sua propriedade. Seu Criador, que os formou, tem sobre eles reivindicações das quais não podem livrar-se justamente. Toda transgressão desnecessária das
leis que Deus estabeleceu em nosso ser é virtualmente uma violação da lei de Deus, e é um pecado tão grande à vista dos Céus como quebrantar um dos Dez Mandamentos.” — Conselhos Sobre Saúde, pág. 40.
Que nossa saúde, felicidade e santidade dependem em grande parte da conformidade com as leis de vida e saúde instituídas por Deus é evidente na lei fundamental que constitui a base de todas as outras leis — a lei da causa e do efeito. Paulo a enuncia em termos inequívocos em Gálatas 6: “Não vos enganeis: de Deus não se zomba; pois aquilo que o homem semear, isso também ceifará.” Verso 7. Segundo se tem afirmado, “cedo ou tarde todos temos de assentar-nos para um banquete de consequências”. O cardápio do banquete de consequências é o resultado do que temos acumulado dia a dia.
Obviamente, portanto, necessitamos do poder e da graça de Deus para pôr todo o nosso estilo de vida em conformidade com as leis da vida e da saúde. Esta é uma das preocupações de Paulo no livro de Romanos: “Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis os vossos corpos por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. E não vos conformeis com, este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.” Rom. 12:1 e 2.
O grande objetivo da saúde não é ter saúde pelo amor a ela, mas santificação e restauração à imagem de Deus. “A santificação exposta nas Sagradas Escrituras tem que ver com o ser todo — as partes espiritual, física e moral. Eis a verdadeira ideia sobre a consagração perfeita…. A verdadeira santificação é inteira conformidade com a vontade de Deus… Jesus suscita uma nova vida, que penetra todo o ser.” — A Santificação, págs. 7-9.
Em 1905 Ellen White escreveu: “Todo obreiro evangélico deve sentir que instruir o povo quanto aos princípios do viver higiênico, é uma parte do trabalho que lhe é designado. Grande é a necessidade dessa obra, e o mundo está aberto para ela.” — A Ciência do Bom Viver, pág. 147. Se o mundo estava aberto para esta mensagem oitenta anos atrás, hoje em dia certamente ele está ainda mais aberto, pois as pessoas parecem ter crescente interesse na saúde. Se você pensa que não é assim, visite uma banca de jornais ou uma livraria local e veja quantos livros e revistas estão sendo produzidos sobre assuntos de saúde, e como muitos deles salientam especialmente os aspectos preventivos do cuidado médico. Note também quão frequentemente é apresentado alguma coisa sobre este assunto pelo rádio ou pela televisão.
A Comissão Para um Período de Vida Mais Longo, em San Marcos, Califórnia, publicou alguns dados no começo de 1980 predizendo crescente interesse na saúde por parte do povo dos Estados Unidos. Entre outras predições, eles prevêem “uma ampla tendência entre os jovens para os hábitos saudáveis, incluindo um grande declínio no vício de fumar e um grande aumento do ato de correr”. Para ser-vir de reforço, eles comentam que tem havido significativo declínio no hábito de fumar entre estudantes universitários nos últimos cinco anos. Também predizem um aumento nos meios de auxílio médico individual e afirmam que “nos últi-mos dois anos foram publicados mais livros sobre auxílio médico individual do que nos dez anos anteriores”. Este campo de ação, ensinando as pessoas a encontrar a saúde por si mesmas, não somente está tendo cada vez maior significação, mas deve ser um setor no qual os adventistas do sétimo dia podem assumir a dianteira.
Que oportunidade a ênfase atual sobre a saúde e a medicina preventiva apresenta para crescente penetração médico-missionária! E o ministério da saúde realmente é atuante. Talvez leve mais tempo para ver resultados do que nalgum outro método de penetração, mas ele alcança pessoas que não se mostrariam sensíveis a métodos ordinários. Não devemos ficar demasiado surpresos porque ele é tão eficaz, quando a serva do Senhor torna claro que “a obra médico-missionária é uma coisa sagrada imaginada pelo próprio Deus…. Os que cooperarem com Deus em Seu esforço para salvar, trabalhando nos moldes em que Cristo trabalhou, serão inteiramente bem-sucedidos” (Medicina e Salvação, pág. 131).
O capítulo cinquenta e oito de Isaías é um dos grandes capítulos médico-missionários da Bíblia. De acordo com Ellen White, este capítulo descreve o lugar da obra de amor e restauração da ênfase evangelística da Igreja de Deus nos últimos dias. (Beneficência Social, pág. 29.)
Isaías 58:6 e 7 inclui o seguinte como tipos de trabalho em que Deus espera que Seu povo se empenhe: 1) soltar as ligaduras da impiedade; 2) desfazer as ataduras da servidão, deixar livres os oprimidos e despedaçar todo jugo; 3) repartir o pão com o faminto; 4) recolher em casa os pobres desabrigados; 5) cobrir o nu; 6) não esconder-se do semelhante.
Note quão espetaculares serão os resultados dessa obra médico-missionária quando pomos o plano de Deus em plena execução. De acordo com os versos 8 e 9: 1) romperá a tua luz como a alva; 2) a tua cura brotará sem detença; 3) a justiça do Senhor irá adiante de ti; e 4) o Senhor atenderá as tuas petições.
Uma condição sumamente importante para o êxito especificada no verso 9: “Se tirares do meio de ti o jugo, o dedo que ameaça, o falar injurioso.” Uma das principais faltas do povo de Deus hoje em dia — uma falta que o evangelismo médico-missionário procura ajudar a corrigir — é a falta de preocupação e interesse pelas necessidades dos outros. Esta indiferença é especialmente manifestada pelo espírito de crítica. Quando a igreja não é uma igreja que ora e trabalha, ela tende a ser uma igreja que critica. Mas isto pode ser sanado: 1) abrindo a alma ao faminto; e 2) fartando a alma aflita (verso 10).
Quando semelhante ministério de abnegado amor caracterizar a Igreja de Deus, cumprir-se-á a parte restante da profecia: “Então a tua luz nascerá nas trevas, e a tua escuridão será como o meio-dia. O Senhor te guiará continuamente, fartará a tua alma até em lugares áridos, e fortificará os teus ossos; serás como um jardim regado, e como um manancial, cujas águas jamais faltam.” Isa. 58:10 e 11.
O método de aproximação da saúde, com sua ênfase equilibrada sobre a restauração e o bem-estar da pessoa toda, não pode deixar de melhorar a qualidade da experiência dos que são trazidos para a igreja por meio desse empenho missionário. A junção do método da saúde numa campanha evangelística indica que as pessoas convertidas estão bem fundadas na mensagem total da Igreja, como resultado da aproximação total que foi usada.
Se é que devemos atingir toda pessoa sobre a Terra com a mensagem do evangelho, precisamos alcançar as pessoas onde elas se encontram, e onde estão seus interesses e necessidades, levando-as gradualmente a sentir maior necessidade de Jesus Cristo e firmando a confiança nEle. Deus concedeu a cada um de nós certos interesses, talentos e perícia que podem ser usados para conquistar as pessoas para Cristo de muitas maneiras singulares. Jesus usou a aproximação do “evangelho da saúde” para alcançar as pessoas. “Por métodos inteiramente Seus, ajudava a todos quantos se achavam em aflição e dor. Com graça terna e cortês, ajudava à alma enferma de pecado, levando-lhe saúde e vigor.” — A Ciência do Bom Viver, pág. 23. Quando seguimos o Seu exemplo, empenhando-nos em amoroso e abnegado ministério em prol das prementes necessidades dos que nos rodeiam, nossa obra “não há de, não pode ficar sem frutos” (Idem, pág. 144).