Deus quer que os casais imitem o laço de amor existente entre Cristo e Sua igreja, e que se previnam contra os substitutos que às vezes penetram no vácuo de um relacionamento perturbado
“Será que pela nossa lei um homem pode, por qualquer motivo, divorciar-se da sua mulher?”, perguntou a Jesus o esperto fariseu, imaginando que o Mestre não teria resposta. “Desta vez, com certeza O apanhei”, pensou. “Ele não pode dar a resposta certa à minha pergunta. Se disser que o divórcio é legal, perguntarei por que nossos escritos sagrados dizem que o casal, unido por Deus, é uma só carne. Agora, se disser que o casamento é indissolúvel…”
“Por acaso vocês não leram o trecho das Escrituras?”, perguntou Jesus. “Não leram o texto segundo o qual no começo, o Criador os fez homem e mulher, e os dois se tomam uma só pessoa? Assim não são duas pessoas, mas uma só. Portanto, que ninguém separe o que Deus uniu.” (Ver Mat. 19).
“Finalmente nós o pegamos”, pensaram os fariseus que assistiam à cena, enquanto zombavam polidamente por traz dos rostos sérios. “Então, por que”, continuava o interpelador, “Moisés permitiu ao homem dar um documento de divórcio à sua mulher e mandá-la embora?”
Os fariseus seguraram o fôlego, esperando que o Mestre contradissesse Moisés. Era exatamente essa a munição que eles precisavam para comprovar sua convicção. “Nós solenemente juramos que ouvimos esse homem, Jesus de Nazaré, dizer que a lei de Moisés não mais deveria ser mantida ou guardada.” Heresia! Blasfêmia! Fora com Ele, a multidão gritaria. Mas Jesus direcionou a seus inquiridores um longo e triste olhar. “Moisés deu essa permissão por causa da dureza do coração de vocês”, Ele finalmente disse. “Mas, no princípio da criação não era assim. Portanto eu afirmo o seguinte: o homem que se separa de sua mulher, a não ser em caso de adultério, se tornará adúltero se casar com outra mulher.”
Outra vez, um grupo de fariseus tentou desaparecer, saindo pelos fundos. Simplesmente não daria certo levantar-se em um tribunal diante da multidão e dizer: “Este homem diz que a lei de Moisés era necessária por causa dos meus pecados.” Não. Seria muito melhor esperar até que outra evidência mais convincente aparecesse.
Ensino pelo exemplo
Entretanto os discípulos estavam preocupados. Eles sabiam que a pergunta era uma armadilha, mas também sabiam que Jesus acreditava no que falava. Nenhum divórcio é possível? E se a mulher fosse estéril? Ou alcoólatra? Ou preguiçosa? Estaria o casamento destinado a ser uma sentença ou pena de vida?
Um dos discípulos – teria sido Pedro? – cutucou Jesus e disse: “Se o casamento precisa ser assim, então é melhor não casar”, contando com um murmúrio de aprovação dos demais. “Este ensinamento não é para todos, mas somente para aqueles a quem Deus o tem dado” (Mat. 19:11, BLH).
E então o assunto foi encerrado. Muitas crianças, levadas por suas mães, esperavam para ser abençoadas. Mas eu não creio que os discípulos deixaram de pensar no assunto. Divórcio é um tema que desperta a atenção das pessoas. Talvez alguns discípulos estivessem lutando ou estivessem preocupados com os filhos que estavam em situação semelhante. Como poderiam eles resolver seus problemas se o divórcio não fosse permitido?
Se Jesus lhes deu uma resposta direta, isso não está relatado na Bíblia. Mas deu-lhes uma infinidade de respostas indiretas: “Ao que demandar contigo e tirar-te a túnica, deixa-lhe também a capa” (Mat. 5:40). “Não te digo que até sete vezes [se deve perdoar], mas até setenta vezes sete” (Mat. 18:22).
Jesus também lhes mostrou Seu modo de vida. Quando faltou um servo, Ele fez o trabalho de lavar os pés aos discípulos. Voluntariamente foi ao Calvário e ao túmulo. Até mesmo após a ressurreição, preparou a refeição da manhã para os discípulos. O Príncipe da Paz lavando os pés, sofrendo, cozinhando o desjejum? Paulo resume o estilo de vida de Jesus, na carta aos filipenses: “Ele sempre teve a mesma natureza de Deus, mas não insistiu em ser igual a Deus. Ao contrário, pela Sua própria vontade, abandonou tudo o que tinha e tomou a natureza de servo. Ele Se tomou semelhante ao ser humano e apareceu na semelhança humana. Ele Se rebaixou, andando nos caminhos da obediência até a morte – e morte na cruz” (Filip. 2:6-8, BLH). Jesus era humilde. Ele estava disposto a servir. Deu tudo o que tinha.
O conselho de Paulo
O que isso tem a ver com o casamento? Paulo disse que um casal cristão deveria seguir o exemplo de Jesus. “Sejam obedientes uns aos outros, pelo respeito que têm a Cristo”, ele escreveu em Efés. 5:21 (BLH). “Mulheres, obedeçam aos seus maridos, como obedecem ao Senhor” (v. 22). “Maridos, amem as suas mulheres, assim como Cristo amou a igreja e deu a Sua vida por ela” (v. 25). “Também vocês, maridos, na vida em comum com suas esposas, reconheçam que elas… devem ser tratadas com respeito. … façam isso para que nada atrapalhe as orações de vocês” (I Ped. 3:7, BLH).
O conselho de Paulo, especialmente na parte que se refere às esposas, está perdendo a popularidade nesta época de liberação. Muitas mulheres ainda concordam que é uma boa ideia para um homem amar sua esposa, mas poucas continuam com a ideia sequencial de que as esposas deveriam submeter-se aos maridos. “Os tempos mudaram”, é o que ouvimos sempre.
Nos dias de Paulo, uma mulher tinha que ser submissa, se quisesse viver. E o apóstolo estava dizendo às mulheres como deveriam agir da melhor maneira possível em uma situação má. Ele também falou aos escravos que fossem submissos e obedientes; mas isso não significa que ele era favorável à escravidão. A mensagem do evangelho é que todos nós somos um em Cristo Jesus (Gál. 3:28). A mensagem do evangelho, argumentam alguns, livrará a mulher da submissão.
Esclarecendo distorções
Há mais do que uma pitada de verdade no argumento feminista. Os tempos realmente mudaram. Mas, porventura está a submissão desatualizada? O que há na submissão que as mulheres acham tão difícil de praticar? O que é uma mulher submissa? É fraca? Cede aos caprichos do marido? É uma mártir? É um capacho para a família pisar? Deve consentir em ser abusada pelo próprio marido? Recusa-se a assumir a responsabilidade por suas próprias ações? É um ser humano inferior?
São essas as idéias que sobem à mente de muitas pessoas, ao ouvirem a palavra submissão. Se é isso o que sentem; se, para elas, esse é o significado da palavra, então estão certas. A mensagem do evangelho tem destruído toda razão para continuar esse tipo de existência. Mas os escritores bíblicos não viam as mulheres através dessa ótica. Pedro, por exemplo, disse que as mulheres, junto com os homens, eram “co-herdeiras da graça da vida” (I Ped. 3:7). Isto significa que elas são iguais aos homens, diante de Deus. Paulo falou carinhosamente sobre umas doze mulheres cristãs, muito serviçais, incluindo Júnia, a quem ele chamou de apóstolo (Rom. 16:6 e 7). Assim, Paulo não relaciona submissão com timidez ou falta de competência.
O que significa submissão? Significa colocar alguém à frente de você; permitir que outra pessoa seja a primeira. Submissão, nesse caso, significa ser altruísta, não insistir pelo maior pedaço da torta. É continuar e acompanhar o plano de alguma outra pessoa. Por mais liberada e livre que seja, uma pessoa cristã é submissa.
Mas a submissão não acontece naturalmente. Um bebê não nasce altruísta. Gastamos anos tentando ensinar nossos filhos a compartilhar. Lembra-se daquele cântico infantil: “Com duas bonecas contente estou, mas nada tens e uma te dou”? Algum tempo atrás ouvi da filha de uma amiga e
com ela aprendi uma versão nova que me encantou: “Eu tenho um brinquedo e não tens nenhum; contigo partilho o único meu…”
Quando uma criança chega ao ponto de compartilhar seu único carrinho, sua única boneca, ou seja lá o que for realmente importante para ela naquele momento, está finalmente começando a entender e desenvolver o altruísmo. E isso é tudo o que significa submissão. É estar disposto a abrir mão de, ou partilhar algo que é realmente importante para você, em favor da felicidade ou do bem-estar de alguém. É ser o tipo de pessoa que Cristo era aqui na Terra.
Submissão é o próprio fundamento do cristianismo. Se isso parece uma declaração muito ampla, pense no que é o oposto de submissão: orgulho. Isso era Lúcifer. Foi ele, e não Cristo, quem disse: “serei semelhante ao Altíssimo” (Isa. 14:14). Cristo, por outro lado, planeja submeter tudo a Deus. Em I Coríntios 15:28, lemos que “quando, porém, todas as coisas Lhe estiverem sujeitas, então, o próprio Filho também Se sujeitará Aquele que todas as coisas Lhe sujeitou, para que Deus seja tudo em todos”.
Homem submisso
Espero que ninguém pense na submissão como sendo algo exclusivo para as mulheres. Paulo diz que os esposos e esposas devem ser submissos um ao outro. É absolutamente injusto dizer que um casamento é cristão, se a esposa é submissa e o marido não é. Mas muitos homens cristãos esperam exatamente isso.
A propósito, um casamento unilateral não é necessariamente destinado ao fracasso. Pedro sugere que uma esposa submissa, casada com um homem não-cristão, pode ganhá-lo para Cristo, sem lhe dizer uma palavra. Se o marido é autoritário, a esposa ainda pode escolher ser submissa a ele, e ser enriquecida nesse processo. Mas até que ele se volte e também se submeta, ela não tem um casamento verdadeiramente cristão.
Até mesmo no matrimônio cristão mais comprometido, a submissão às vezes falha. O que acontece quando o marido insiste em ter satisfeita sua vontade, mesmo que seja apenas uma vez? Ele quer passar as férias nas montanhas e ela prefere a praia. Ele se recusa a considerar a praia e começa a gritar, quando ela toca no assunto. O que faz a esposa? A resposta de Paulo seria: “seja submissa.” A resposta moderna é: “tentem chegar a um meio termo.” A resposta realista é: “os dois brigam.” Fazer um acordo e chegar a um meio termo é ótimo, mas isso geralmente não acontece quando um dos cônjuges está determinado a fazer de acordo com sua própria vontade. Se a esposa é muito liberal para submeter-se, a explosão é inevitável. A menos que o marido subitamente se lembre que é um cristão e decida submeter-se.
“Está bem”, murmura a esposa, com os dentes apertados, “eu serei submissa quando ele o for.” Espere um pouco! Se ele se submete, por que ela precisaria fazê-lo? Essa esposa não está se submetendo; está, sim, negociando.
Limites
Mas, até onde deveria ir a submissão? Como conselheiro matrimonial, tenho acompanhado esposas que foram severamente espancadas pelo marido. Se um marido bate tão violentamente na esposa, de tal modo que ela acaba precisando de uma cirurgia plástica; se ele a agride diante das crianças, deveria ela ser submissa? Evidentemente não. A mulher ideal de Deus, conforme descrita em Provérbios 31, mantém seu auto-respeito. “É forte, respeitada e não tem medo do futuro” (v. 25, BLH). Uma mulher temente a Deus é submissa, mas não ao ponto de perder sua dignidade ou sua própria vida. Não é uma pessoa fraca nem um capacho. Não tem de tolerar um abuso que ameace sua moralidade ou sua própria vida.
Então, uma esposa deveria ser submissa apenas em áreas pequenas e insignificantes? Não. Pela definição de Paulo, ela deve ser submissa enquanto for fisicamente seguro e moralmente permissível. Ela certamente terá de abrir mão de algumas vontades e, talvez, até necessidades. Humanamente falando, nunca é conveniente dar o outro lado do rosto ou ir andar a segunda milha. Entretanto, muitas senhoras se sacrificam por seus filhos. Não fariam elas o mesmo por seus maridos, mesmo quando eles se esquecem de como Cristo amou a igreja e deu-Se a Si mesmo por ela?
Os discípulos ficaram horrorizados quando Cristo disse que o casamento era permanente. Eles não podiam compreender como alguém se arriscaria a casar, se o divórcio não fosse permitido. Mas eles também não compreendiam muitas outras lições que Jesus desejava lhes ensinar. Quando uma determinada cidade tratou rude e grosseiramente a Jesus, Ele aceitou os insultos e foi para outro lugar. Mas Tiago e João queriam mandar fogo sobre a primeira cidade. Quando os soldados prenderam Jesus, Ele calmamente concordou em ir com eles. Pedro reagiu cortando a orelha do servo do sumo sacerdote.
Pedro, Tiago e João eram os discípulos mais íntimos de Cristo. Levou um longo tempo para que os doze entendessem que Jesus os estava chamando à submissão. Mas eles tiveram de aprender essa lição antes que o Mestre pudesse enviá-los a um mundo hostil para pregarem Sua mensagem de amor e perdão. Tenho a impressão de que, uma vez que eles aprenderam a submeter-se a Cristo e uns aos outros, finalmente compreenderam a declaração de Jesus sobre o divórcio.
Amor incondicional
Atualmente, em alguns países, uma pessoa não precisa alegar infidelidade ou crueldade para obter o divórcio. Tudo o que precisa ser alegado são as diferenças irreconciliáveis ou a incompatibilidade. Mas, pode um casal cristão, duas pessoas que acreditam na humildade, no serviço, e no ilimitado perdão, ter diferenças irreconciliáveis? Não será melhor que ambos, marido e mulher, busquem juntos uma vida de amor verdadeiro e crescente? Lembrem-se de que o caminho de Deus é muito melhor para todos os que desejam trilhá-lo.
É da vontade de Deus, em todo casamento, que o casal ame um ao outro com uma atração espiritual, emocional e física absorvente, que continua a crescer ao longo de toda a sua vida juntos. Deve ficar claro que Deus deseja que os casais imitem o laço de amor que existe entre Cristo e Sua igreja, e que se previnam contra os substitutos que às vezes penetram no vácuo de um relacionamento perturbado.
Procurem desenvolver a visão sugerida em Provérbios 4:25 e 26, BLH: “Olhe firme para a frente, com toda confiança; não abaixe a cabeça envergonhado. Pense bem no que você vai fazer e todos os seus planos darão certo.”
José Carlos Ebling, Ph.D., professor no Centro Universitário Adventista, Engenheiro Coelho, SP