Roberta olhou o boletim pela segunda vez. Ela não era adepta de qualquer igreja. Vivia fora de casa, alistada no Exército dos Estados Unidos da América do Norte. Alguma coisa no boletim anunciando uma série de conferências evangelísticas chamou sua atenção. Como as palestras abordariam certas áreas específicas de sua vida, ela resolveu ir ao local de reuniões. Foi bem recebida pelas recepcionistas, e cada semana reunia-se com Tiago, um diácono da igreja, e sua esposa, para estudos mais profundos sobre a vida cristã. Algumas vezes faziam refeições juntos.
Terminado o seu período de serviço no exército, Roberta voltou à vida civil. Imediatamente uniu-se à igreja e batizou-se pouco tempo depois. Aconteceu, no entanto, uma tragédia. O relacionamento de Roberta com Tiago tornou-se cada vez mais estreito até que uma gravidez a surpreendeu. Confusa a respeito do que fazer, ela procurou Maria, um membro da equipe evangelística e alguém em quem ela pensava poder confiar.
Dentro de pouco tempo, a notícia espalhou-se. A comissão da igreja reuniu-se para discutir a disciplina que seria imposta ao caso. Cópias de uma carta anônima foram distribuídas, advertindo as famílias no sentido de não darem abrigo a Roberta, como medida para proteger os esposos.
Devastada, Roberta deixou a comunidade, praticou um aborto, e reintegrou-se no exército. Foi aí que a encontrei. Na verdade, quando nos vimos, percebi que ela queria algo mais do que uma higiene mental ou psicológica pode oferecer. As questões com as quais lutava incluíam Deus, igreja e pessoas. Minha responsabilidade para com Roberta era mais que a de um pastor. Por duas vezes, ela confiou. E duas vezes foi traída. Primeiro, um diácono no qual ela buscou orientação espiritual. Depois, Maria, para quem ela abriu seu coração.
Roberta sentia-se condenada e rejeitada. Ela e eu necessitávamos falar sobre Deus e pessoas que agem em lugar de Deus. Necessitávamos falar sobre pecado, culpa e perdão. Roberta necessitava compreender a natureza humana e a restauradora graça de Deus. Esses são alguns assuntos que afetam o aconselhamento pastoral.
Mais que conselhos
O que é aconselhamento pastoral? É mais que dar conselhos sobre temas espirituais ou explanar as Escrituras. Funde perspectivas teológicas com o aconselhamento em si. A Teologia nos fala como Deus interage na vida humana, e as ciências sociais nos expõem as necessidades e o comportamento humanos. Aconselhamento pastoral trabalha com os dois aspectos e beneficia àqueles que enfrentam barreiras. Sem uma perspectiva teológica, o aconselhamento deixa de ser pastoral. Por outro lado, sem uma compreensão da natureza e do comportamento humano, o aconselhamento é de pouco valor.
Tomemos por exemplo a culpa, uma condição humana universal. Como conselheiros pastorais, temos algo mais a oferecer a pessoas escravizadas pela culpa, do que os conselheiros profissionais. Podemos falar do perdão de Deus, reconciliação e restauração. Em virtude disso, um conselheiro pastoral devidamente habilitado pode ajudar a pessoas que, como Roberta, lutam com a culpa.
Eduardo serviu ao Exército americano por quase 30 anos, alcançando importantes posições. Mas agora tudo parecia acabado. Esperava que uma comissão de avaliação o recomendasse para uma determinada promoção, o que não ocorreu. Assim, ele considerou sua próxima função o fim de tudo, e, desgostoso, retirou-se da corporação. O problema de Eduardo era essencialmente um conflito espiritual. Em tais situações, a psicologia secular pode dar alguma ajuda, mas um conselheiro sensível à vida em todas as suas dimensões – envolvendo Deus, pessoas, etc. – tem mais para oferecer.
Uma perspectiva espiritual de vida, entre-tanto, nem sempre é bastante para ajudar a indivíduos turbados. Rosa, por exemplo, veio de uma família desajustada. Ainda criança, viu sua mãe tornar-se inválida e confinar-se ao quarto. Seu pai aceitou a fé evangélica e tornou-se líder da congregação local. Mas seu relacionamento com a filha era negativo e agressivo. Freqüentemente atribuía aos “pecados” de Rosa a enfermidade da esposa. Trazia namoradas para a própria casa e também abusava sexualmente da filha. Durante tempos de crise financeira, Rosa tinha que abandonar a escola paroquial, enquanto seu irmão recebia a melhor educação possível.
Finalmente a menina deixou o lar. Parou de freqüentar a igreja e adotou um estilo de vida que lhe deixou mais atormentada ainda. Mas alguma coisa começou a chamar-lhe de volta às antigas raízes. Ocasionalmente se aventurava a procurar uma congregação, buscando ajuda para mudar. Um pastor aconselhou-a a perdoar o pai, e orar para fortalecer-se espiritualmente.
É claro que o pastor estava certo. Rosa necessitava perdoar seu pai, mas isso viria depois. Sua necessidade momentânea era de ajuda para romper com aquele estilo destrutivo de vida. Foi então a uma clínica de saúde mental, onde uma equipe médica sugeriu-lhe que a restauração de seu relacionamento com a igreja poderia ser saudável. Como ministro, uni-me à equipe.
Mais que oração
Levei a sério o chamado da igreja para uma mudança de estilo de vida, mas alguém que convida à mudança deve também proclamar o poder pelo qual isso é possível. Uma atormentada Rosa necessitava mais que oração. Usar o conhecimento que Deus tem providenciado, da natureza humana, não significa negação da fé. Rosa precisava mais ajuda do que o pastor sozinho podia oferecer.
Para aqueles que têm interiorizado valores religiosos, a religião é realmente um fator positivo na saúde mental e na vida social. Mas tal não é o caso com aquelas pessoas cujos valores religiosos são externos, e elas necessitam de aconselhamento pastoral. O pastor conselheiro pode ajudar-lhes a reconhecer que o comportamento destrutivo é, freqüentemente, sintomático de uma profunda crise espiritual. Esse reconhecimento demanda um correto relacionamento com Deus, antes de qualquer tentativa para mudar o comportamento.
Os indivíduos comumente expressam suas questões emocionais em termos de pessoas, objetos e instituições que são significativas em suas vidas. Isso inclui Deus, igreja, familiares, sociedade, escola e ambiente de trabalho. Por ocasião da morte de crianças, por exemplo, eu tenho recebido mães que chegam a me golpear com os punhos, esbravejando contra Deus. Jamais tento defender a Deus. Ele nunca é o problema. A questão é a perda em si e a tristeza. É para isso que tento direcionar a atenção.
Nem tudo é pecado
Tenho visto pessoas em aberta rebelião contra os padrões de sua igreja. Usualmente o problema não é uma luta religiosa, mas uma falha em aceitar autoridade. Tratar com essas pessoas num plano religioso é freqüentemente insensato. Para ser efetivo, o conselheiro pastoral deve ajudar-lhes a resolver a questão subjacente de aceitação da autoridade. Uma vez feito isso, a luta com Deus e a igreja estaria aparentemente resolvida.
Um comportamento destrutivo nem sempre é fruto de pecado pessoal. Outros fatores podem estar envolvidos. Algumas enfermidades mentais, por exemplo, estão associadas com anormalidades cerebrais e genéticas, ou neurose química. A sugestão de que oração e teologia representam a resposta final para seus problemas, não é uma ajuda total. A causa implícita clama por atenção. Daí a necessidade de que os ministros envolvidos com aconselhamento tenham treinamento adequado na compreensão das condições humanas e sejam hábeis para relacionar-se apropriadamente com pessoas problemáticas.
Consideremos o caso de João e Jane. Eles dedicaram suas vidas ao Senhor e tornaram-se líderes na congregação que freqüentavam. Vieram de boas famílias. Mas acabaram se deparando com um processo traumático de divórcio. Acusações de parte a parte foram trocadas. O processo de audiências arrastou-se por meses. As crianças sofreram. Durante o aconselhamento, foi descoberto que os pais de ambos tiveram uma experiência passada semelhante. E também eram líderes de igreja. Seu casamento também foi desfeito através do divórcio, entre grosseiras acusações.
Segundo as ciências sociais, muito do comportamento destrutivo é aprendido. As teorias a respeito do sistema familiar sugerem que geralmente há uma terceira e quarta geração de conduta defeituosa. Jane e João necessitavam aprender novas maneiras de viver e relacionar-se. Necessitavam de conselheiros pastorais que compreendessem seus problemas. Desafortunadamente, tal aconselhamento não chegou a tempo.
Nenhum conselheiro pastoral será capaz para providenciar toda ajuda necessária. Alguma coisa sempre terá de ser feita por outros profissional. Isso não significa abandono da pessoa por parte do pastor. Quando pastor, capelão e outros conselheiros trabalham juntos, num relacionamento cooperativo, o processo da cura é realçado.