Como ser um líder espiritual disruptivo
Vivemos uma época de evolução tecnológica e revoluções sociais que resultaram em pessoas muito críticas. Um tempo de debates virtuais, fake news, polarizações políticas e convergência humanitária entre as grandes religiões. O ser humano está mais espiritualizado, porém menos propenso a submeter-se ao divino, por viver suas verdades produzidas em laboratório.1
Essas rápidas e constantes mudanças, com impactos profundos no âmbito social, criaram a necessidade de romper com antigos modelos de liderança. Um novo movimento, disruptivo, tem sustentado a visão de que pessoas são o meio e o fim de qualquer organização.2
Nova maneira de liderar
Liderança disruptiva é a substituição do modelo de líder-gerente, especializado na função e nos métodos, pelo líder que age como um educador social.3 O foco é o desenvolvimento pessoal em uma sociedade que se acostuma com movimentos contínuos de quebra de paradigmas culturais, geográficos, tecnológicos e religiosos.4
Nesse contexto, líderes espirituais disruptivos abrem espaços para que os membros da igreja encontrem seu lugar no serviço cristão, mediante a lapidação de competências espirituais e morais. A fim de alcançar esse objetivo, procuram simplificar o acesso ao conhecimento sobre Deus, aos relacionamentos saudáveis e ministérios da igreja. Nesse paradigma, todos são relevantes, trabalham com uma agenda individual, mas sem fugir dos pactos comunitários.
Isso exige um modelo de liderança cíclico, não centralizador. Embora tudo passe pelo líder, também deve ser compartilhado com os envolvidos nos processos que formam o movimento da igreja. A ideia é que cada membro seja líder em uma microárea, sincronizado por um sistema que preze pela coerência entre as crenças e a forma de viver, principalmente em sociedade (compliance).5
Nesse modelo cíclico, o líder compartilha a autoridade com seus colaboradores, permitindo que as equipes de trabalho escolham, acolham e avaliem seus novos membros. Sabiamente, mistura pessoas experientes com inexperientes e permite que elas cresçam a partir desse relacionamento. Competências espirituais, morais e técnicas são avaliadas para que cada membro se sinta adequado às funções que lhe são designadas.
Em suma, líderes espirituais disruptivos tratam cada pessoa com valor inestimável, reconhecendo as histórias singulares e de superação que a acompanham. Ou seja, fazem com que todos sejam importantes pelo que são e não pelo que fazem. São especialistas em direcionar as experiências cristãs individuais para um movimento coletivo que se torna a força da igreja.
Liderança disruptiva bíblica
Na Bíblia, o desenvolvimento de Israel ocorreu mediante a diversidade de líderes que, muitas vezes, atuaram juntos. Foram reis, profetas, pais, mães, chefes do exército, anciãos, juízes, sacerdotes, enfim, uma variedade de homens e mulheres chamados para a edificar o povo de Deus.
Um dos exemplos de líder espiritual disruptivo nas Escrituras é Moisés. Já idoso, ele foi desafiado a mudar as crenças sobre suas qualidades para liderar o povo hebreu. Sabiamente, formou uma equipe com os irmãos a fim de superar suas fraquezas. Encarou o faraó, a maior autoridade da época, tendo o Senhor como conselheiro e usando um cajado como ferramenta de trabalho.
Sua liderança foi marcada pelo senso de dependência de Deus e reverência ao Seu nome. Por intermédio de Moisés, o Senhor abriu o mar Vermelho, entregou Sua lei escrita em tábuas de pedra aos israelitas, providenciou água da rocha e pão do céu. O grande profeta inovou ao adotar a sugestão de seu sogro, estabelecendo uma estrutura judicial baseada na formação de grupos, a fim de administrar as demandas apresentadas pelo povo de Israel (Êx 18).
Após séculos de escravidão, os israelitas experimentaram uma grande revolução liderada por Moisés. A partir do Êxodo, eles passaram a viver em uma nova condição social, sendo cidadãos livres de uma nação conduzida por Deus. Infelizmente, com o tempo, desprezaram a orientação divina, escolheram imitar as nações ao redor e acabaram no exílio.
Apesar disso, o Senhor levantou líderes que estavam dispostos a enfrentar os medos, ansiedades e mudanças de maneira ousada. Eles desejavam influenciar todos os povos a fazer a vontade de Deus, adorando-O e obedecendo-Lhe (Sl 22, 66, 71; Is 51:4; Jn 1–4; Ag 2:7; Zc 2:11).
Como ser um líder disruptivo
1. Permita-se ser conhecido. Não deixe que sua posição exerça mais autoridade do que seu testemunho pessoal. Sua igreja o conhece, de fato? Sabe de seus medos, traumas e sonhos? Conhecer e ser conhecido é fundamental para quem deseja ter uma liderança espiritual disruptiva.
2. Seja uma pessoa visionária. Dennis Gabor afirmou que “a melhor forma de predizer o futuro é cria-lo”. Você se sente pronto para isso? Qual é o tamanho da sua igreja e a dimensão da liderança que exerce sobre ela? O líder visionário é sensível à voz do Espírito Santo, conhece o passado da igreja e olha para o futuro com otimismo. Além disso, investe a maior parte de seu tempo em educar as pessoas para que pensem biblicamente.
3. Tenha propósitos. Outra característica do líder espiritual disruptivo é a importância que dá ao propósito. Para ele, o futuro não é apenas tempo, mas local de realizações. É um visionário construtor de pontes, mesmo andando em terrenos moralmente movediços. Por pensar no futuro, ele foge de uma postura imediatista ou presa ao passado. Assim, não se limita aos resultados antigos, atitude que resulta em obsolescência e leva a igreja a uma curva espiritualmente descendente.
4. Diversifique as formas de atuação. O cristianismo nasceu centrado na pregação da Palavra e no testemunho a respeito de Jesus. Ao expandir sua influência e engajar pessoas, diversificou o atendimento social por meio dos dons espirituais. Temas como saúde, educação, adoração e caridade se tornaram importantes para o movimento do corpo de Cristo. Assim, mais pessoas participaram da jornada cristã como abençoadores ou como abençoados (1Co 12–13).
5. Seja inovador. Inovação é resultado da mente que sabe analisar cenários e tendências, retendo o que é bom para a comunidade de fé. O líder inovador se especializa em atender as necessidades dos membros e da comunidade, usando recursos diferentes e efetivos. Ele tem sensibilidade para captar informações a respeito de todas as pessoas que estão sob sua responsabilidade. Ao saber lidar com cada uma delas, o líder se torna um catalisador para o amadurecimento da igreja.
6. Valorize a tecnologia. O líder espiritual disruptivo busca conhecer novas tecnologias a fim de usá-las em benefício do cumprimento da missão da igreja. Por isso, procura descobrir como as novidades podem ser usadas estrategicamente para proclamação da mensagem do evangelho e benefício da comunidade em geral. Pense em como o cristianismo tem influenciado os rumos de nossa sociedade. Embora o número de cristãos protestantes tenha crescido em muitos países da América do Sul, a imoralidade, violência e os vícios não diminuíram na mesma proporção. O que há de errado?
O processo disruptivo
Todos os membros da igreja precisam ser desafiados a crescer em Cristo, tendo a mente transformada pelo Espírito Santo (Rm 12:1-3). Assim, o papel do líder espiritual disruptivo é inspirá-los a avançar nesse propósito, advertindo-os que não se deixem engessar por uma série de ações irrefletidas. Para que esse processo ocorra, é necessário seguir alguns passos.
1. Cresça espiritualmente. Invista em seu relacionamento com Deus. Dedique tempo para ouvir Sua voz, conversar com Ele e ser moldado de acordo com Seu querer.
2. Concentre-se nas pessoas. Leve a igreja a viver uma experiência de serviço. Ajude os membros da igreja a enxergar as necessidades das pessoas e a saciar os que sentem fome e sede de justiça. Seja simpático e sensível com aqueles que estão abertos para conhecer mais a Deus e Sua Palavra.
3. Multiplique líderes. Reconheça o potencial de liderança de cada membro e valorize a coletividade. Ouça a equipe e trabalhe para que seus componentes estejam em harmonia e vivam os sonhos da igreja. Isso ampliará os resultados e tornará a missão personalizada.
4. Tenha prazo de validade. O líder espiritual disruptivo marca a despedida no ato de posse. Isso quer dizer que ele trabalha intencionalmente para preparar os membros a continuar a jornada após sua partida. Seu trabalho é levar a igreja a se manter espiritualmente renovada para que alcance novos discípulos, independentemente de sua presença. Afinal, se cada membro entender seu papel no corpo de Cristo e aprender a trabalhar em unidade de pensamento e ação, a liderança espiritual disruptiva resultará em uma comunidade espiritual disruptiva, pronta para impactar a sociedade e preparar pessoas para a segunda vinda de Cristo.
Referências
1 Zigmunt Bauman, Modernidade e Ambivalência (Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar, 1999).
2 Sandro Magaldi e José Salibi Neto, Gestão do Amanhã: Tudo o que você precisa saber sobre gestão, inovação e liderança para vencer na 4ª revolução industrial (São Paulo, SP: Editora Gente, 2018).
3 Peter Senge, A Quinta Disciplina (São Paulo: Best Seller, 1992).
4 Thomas S. Kuhn, A Estrutura das Revoluções Científicas (São Paulo, SP: Perspectiva, 1997),
p. 201-230.
5 Marshall Hargrave, Compliance Department. Disponível em <bit.ly/3zPLcdq>, acesso em 23/6/2021.
Marcos Vinícius Santiago, líder de Ministério Pessoal e Escola Sabatina para a região Sudeste do Brasil