Em nosso desenvolvimento deste tema precisamos seguir um esquema muito claro para evitar toda confusão, pois a menor confusão poderia levar-nos a obscurecer a totalidade do que que-remos apresentar, podendo arrastar-nos para alguns dos tantos erros que soem ser cometidos ao tratar de um assunto como este.
Portanto, esta introdução tem duas partes bem definidas: a primeira se ocupa de dar-nos quatro dados prévios indispensáveis para o desenvolvimento do tema, e a segunda nos oferece o esboço de seu desenvolvimento, depois de expor o problema do qual queremos tratar nesta exposição. Dados Prévios Indispensáveis Não se pode desenvolver um te-ma sem definir primeiro o que entendemos por ele; assim, definiremos o Juízo Investigativo, depois indicaremos a necessidade de conhecê-lo, então sua im-portância e, por último, a data quando é realizado.
Definição. — A definição que damos a seguir foi extraída da Enciclopédia Adventista:
“E um termo adventista para a fase preliminar do grande juízo final por meio do qual Deus intervirá nos assuntos humanos para acabar com o reinado do pecado e inaugurar o eterno reino de justiça, de Cristo.’
Esta definição não estará completa se não dissermos em que consiste o juízo investigativo e qual é o seu propósito.
“Consiste num exame dos registros da vida dos que alguma vez professaram aceitar a salvação em Cristo, e cujos nomes, portanto, foram inscritos no ‘livro da vida do Cordeiro’.”2
Seu propósito é verificar se eles estão em condições de ser cidadãos do eterno reino de Deus.
A necessidade de conhecer o juízo investigativo. — Esta necessidade é claramente expressa no seguinte parágrafo:
“O assunto do santuário e do juízo de investigação, deve ser claramente compreendido pelo povo de Deus. Todos necessitam para si mesmos de conhecimento sobre a posição e obra de seu grande Sumo Sacerdote. Aliás, ser-lhes-á impossível exercerem a fé que é essencial neste tempo, ou ocupar a posição que Deus lhes deseja confiar.
As duas primeiras declarações do parágrafo citado não são mais que duas formas de dizer a mesma coisa. Destacamos a força enfática dos verbos utilizados: “deve” e “necessitam”. É um dever e uma necessidade conhecer o juízo investigativo ou o ministério e a obra de nosso grande Sumo Sacerdote. É uma necessidade e um dever porque este conheci-mento é uma das colunas fundamentais da vida do verdadeiro cristão. Um está vinculado a sua relação pessoal com Deus: a capacidade de exercer fé nEle quando tudo parece opor-se à fé; e o outro está vinculado a sua relação com o próximo, visto que “a posição” que Deus nos quer confiar sem-pre estará relacionada com a salvação de nosso próximo por ser este o supremo interesse de Deus sobre a Terra.
O próprio ser do cristão é um ser de fé e ação que se fundamenta em Deus. A ação é uma ação evangélica de proclamação. A fé é uma viva relação não só com o evangelho, mas também com o vivo conteúdo do evangelho: Cristo Jesus. Tudo que um cristão é depende de sua relação pela fé com Cristo e com a missão dada por Cristo. Se tanto a fé como o cumprimento da missão, são afetados pelo conhecimento do juízo investigativo, esse conhecimento certamente se converte numa necessidade e num dever cristão nesta hora de crise em que nos compete viver.
Importância do juízo investigativo. — Só um parágrafo de O Grande Conflito será suficiente para aclarar a tremenda importância dessa parte da obra de Cristo: “A intercessão de Cristo no santuário celestial, em prol do homem, é tão essencial ao plano da redenção, como o foi Sua mor-te sobre a cruz. ”4 O resto do parágrafo que citamos diz o seguinte:
“Pela Sua morte iniciou essa obra, para cuja terminação ascendeu ao Céu, depois de ressurgir. Pela fé devemos penetrar até o interior do véu, onde nosso Precursor entrou por nós. (He-breus 6:20.) Ali se reflete a luz da cruz do Calvário. Ali pode-mos obter intuição mais clara dos mistérios da redenção. A salvação do homem se efetua a preço infinito para o Céu; o sacrifício feito é igual aos mais amplos requisitos da violada lei de Deus. Jesus abriu o caminho para o trono do Pai, e por meio de Sua mediação pode ser apresentado a Deus o desejo sincero de todos os que a Ele se chegam pela fé. ”s
Data do juízo investigativo. — Não nos compete analisar aqui todos os pormenores referentes à data do juízo investigativo, mas simplesmente declarar que se realiza no tempo que decorre entre 1844 e a Segunda Vinda de Cristo.
Problemas a Serem Estudados e Esboços de seu Desenvolvimento O assunto que queremos estudar é simplesmente determinar a obra que Cristo está efetuando no juízo investigativo, a quem afeta e como. Para alcançar este objetivo analisaremos primeiro os serviços do santuário e o juízo investigativo, depois a obra de Cristo desde Sua ascensão, e finalmente faremos uma síntese do que a Igreja Adventista crê acerca do juízo investigativo.
Os Serviços do Santuário e o Juizo Investigativo
A doutrina do juízo investigativo está relacionada com a doutrina do santuário; portanto não pode-mos estudar o juízo investigativo sem considerar primeiro o minis-tério do santuário.
No ministério do santuário havia dois serviços e três espécies de sacrifícios relacionados com eles. Um era o serviço diário. Realizava-se no átrio e no lugar santo, cada dia do ano (Heb. 9: 6). Os sacrifícios apresentados eram o sacrifício da manhã e da tarde — o contínuo — e os sacrifícios que os pecadores apresentavam como oferta por seus pecados individuais. O segundo era o serviço anual, realizado no lugar santíssimo uma vez por ano (Heb. 9:7), quando eram oferecidos sacrifícios especiais. Este recebia o nome de Dia da Expiação.
Os Sacrifícios
Eram a atividade mais importante que se realizava no santuário. Foram o “elemento dominante da religião hebraica” desde “os tempos mais antigos até a destruição do segundo templo no ano 70 d.C.”6
O sacrifício contínuo (Tamid). — Este sacrifício consistia num animal (cordeiro) que era oferecido inteiro, junto com uma oferta de cereal e uma libação (cf. Êxo. 29:38-42; Lev. 6:13; 24:3, 4 e 8; Núm. 28:3 e 6; I Reis 18: 29-36; II Reis 25:29 e 30; II Crôn. 2:3; 24:14; Esd. 3:5; 9:4; Ezeq. 39:14; 46:13-15). Seu nome em hebraico, tamid, significa continuidade, perpetuidade, denotando que devia ser feito continuamente. Por conseguinte, cada dia do ano, de manhã e à tarde, eram oferecidos esses sacrifícios para benefício de todo o povo. Assim se provia expiação para todos. Onde quer que um israelita vivesse, podia elevar o coração a Deus, volver o rosto para Jerusalém, confessar seus pecados e apoderar-se da gratuita provisão dessa expiação (I Reis 8:37, 39, 44, 45, 48 e 49).
Sacrifícios individuais. — Os indivíduos também ofereciam seus próprios sacrifícios à medida que a oportunidade o tornava possível. Estes eram uma expressão de sua gratidão, de sua fé e de sua aceitação da provisão divina para salvá-los do pecado. Nem todas as oferendas dessa espécie eram sacrifícios de animais, como por exemplo a das primícias, mas os sacrifícios expiatórios tinham de sê-lo — pois “sem derramamento de sangue não há remissão” (Heb. 9:22) — como a oferta pelo pecado e a oferta pela culpa (Êxo. 29:10 e 19; Lev. 1:4; 3:2, 8 e 13; 4:4, 24, 29 e 33; 16:21; 24:14; Núm. 27:18; Lev. 5:16 e 19; 7:1-7 e 14; Núm. 5:7 e 8; 6:12; 18:9; II Reis 12:17; Esd. 10:19).
Sacrifícios especiais no Dia da Expiação. — Este dia, chamado em hebraico Iom Cafarim, significa dia de proteção, dia de expiação, dia de refúgio. A expiação é, então, “refugio por meio de representação”.7 Um refúgio sempre implica a existência de um perigo; neste caso o perigo era ser eliminado “do seu povo” (Lev. 23:29). O refúgio provido não era um lugar onde as pessoas pudessem abrigar-se, e, sim, um substituto, um representante: o sacrifício oferecido. Três eram os principais atos do ritual do Dia da Expiação: Em primeiro lugar vinham os sacrifícios que o sumo sacerdote oferecia por si mesmo e por sua casa. Em segundo lugar se oferecia o sacrifício mais im-portante de toda a cerimônia: o bode para Jeová, que provia o sangue expiatório ou purificador. E em terceiro lugar vinha a cerimônia relacionada com o bode para Azazel, cujo sangue não era derramado, pois havia somente um sangue expiatório: o do bode para Jeová. Os ritos desse dia, o único dia de jejum prescrito na lei mosaica, estão registrados em Levítico 16, complementado pelos relatos de Lev. 23:26-32 e Núm. 29:7-11.
Registro dos Pecados
Como se produzia a contaminação do pecado? Meticuloso es-tudo de todo o sistema de sacrifícios do Santuário mostra clara-mente que havia um registro de pecados. Este registro era produzido por transferência: o pecado se transferia do pecador culpado para a vítima que era sacrificada, depois para o sacerdote que comia a carne e por último para o altar e para o santuário, onde era derramado e aspergido o sangue, ou estava presente por meio da pessoa do sacerdote quando entrava nele.
Lemos em Jeremias 17:1: “O pecado de Judá está escrito. . . nas pontas dos seus altares.” Em Levítico 10:17, repreendendo a Eleazar e Itamar por não haverem comido a carne do sacrifício, disse Moisés: “Por que não comestes a oferta pelo pecado no lugar santo? pois coisa santíssima é; e o Senhor a deu a vós outros, para levardes a iniqüidade da congregação, para fazerdes expiação por eles diante do Senhor. (O grifo é nosso.) Lemos também em Lev. 4:17: “Molhará o dedo no sangue, e o espargirá sete vezes perante o Senhor, diante do véu.” “Por esta cerimônia, mediante o sangue, o pe-cado era figuradamente transferido para o santuário.”8
A obra do sacrifício diário era uma obra de reconciliação em prol do homem pecador. Seu pe-cado era perdoado. O transgressor era livrado de sua iniqüidade, mas ficava um sangrento registro do pecado no santuário. Neste sentido, o sacrifício diário cumpria dupla função: era um substituto que obtinha o perdão para o pecador e um meio para registrar o pecado no santuário. O perdão do pecado não elimina a obra do juízo final, mas garante a libertação do pecador, porquanto o registro desse pecado foi efetuado pelo sangue do substituto que, pelo ato do sacrifício, se transformou no autêntico possuidor da culpa.
No santuário celestial, o “verdadeiro tabernáculo” (Heb. 8:2), do qual o santuário terrestre somente era uma “figura e sombra” (Heb. 8:5), também se guardam registros da conduta dos homens. Tanto Daniel como João, em suas descrições do juízo, nos falam de uma cena em que “se abriram os livros” (Dan. 7:10; Apoc. 20:12). Esses livros não são códigos de leis, e, sim, registros de conduta.
A Escritura Sagrada nos fala de dois livros ou espécies de livros: o livro da vida (Êxo. 32: 32; Sal. 69:28; Êxo. 32:33; S. Luc. 10:20; Filip. 4:3; Heb. 12:23; Apoc. 3:5; 20:12 e 15), e o livro de memórias ou memorial (Mal. 3:16 e 17). No livro da vida são registrados “os nomes de todos os que já entraram para o serviço de Deus”.9 No livro de memórias, as obras boas e também as más. Sobre o registro de boas obras, Ellen G. White diz o seguinte: “Estão registradas as boas ações dos que ‘temem ao Senhor. . .’ No livro memorial de Deus toda ação de justiça se acha imortalizada. Ali, toda tentação resistida, todo mal vencido, toda palavra de tema compaixão que se proferir, acham-se fielmente historiados. E todo ato de sacrifício, todo sofrimento e tristeza, suportado por amor de Cristo, encontra-se registrado.”10 Acerca do registro das obras más, ela afirma: “Pecados de que não houve arrependimento e que não foram abandonados, não serão perdoados nem apagados dos livros de registro, mas ali permanecerão para testificar contra o pecador no dia de Deus.”” Há vários textos bíblicos que fazem alusão a um registro dos pecados dos homens. Ver, por exemplo, Ecles. 12:14; S. Mat. 12:36 e 37; I Cor. 4:5; Isa. 65:6 e 7.
É claro, portanto, que o serviço diário expiava o pecado e o registrava no tabernáculo até o Dia da Expiação, quando se purificavam todos os pecados nele acumulados durante o ano todo.
Limpeza dos Registros
“Os pecados de Israel, sendo assim transferidos para o santuário, tornavam contaminados os lugares santos, e uma obra especial se tomava necessária para sua remoção.”12 Deus ordenara que fosse purificada cada uma das partes do sagrado santuário, e também o altar. “E o purificará, e o santificará das impurezas dos filhos de Israel. ” Lev. 16: 19 e 16..
O objetivo da principal cerimônia do Dia da Expiação era limpar os registros dos pecados de Israel que se haviam acumulado durante o ano todo. Para isto o sumo sacerdote entrava no Lugar Santíssimo com o sangue do bode de Jeová. No entanto, não era unicamente purificação e juízo o que se fazia no santuário durante o Dia da Expiação; pois o sacrifício contínuo não cessava nesse dia, indicando assim que continuava a salvação do pecador por meio da administração do perdão.
O sangue do bode de Jeová era para benefício do povo (Heb. 7:27; Lev. 16:30 e 33) e para expiação “pelos filhos de Israel por causa dos seus pecados” (Lev. 16:34). Esse mesmo sangue purificava o Lugar Santíssimo, o lugar santo, o altar e todo o tabernáculo.
Quando a expiação pelo povo e a purificação do santuário já haviam sido realizadas, e quando todos os que queriam ser reconciliados já haviam sido reconciliados, então, e só então, entrava em cena o bode para Azazel (Lev. 16:20). O sumo sacerdote colocava sobre ele os pecados acumulados no santuário e, depois, pela mão de um homem, o bode era enviado ao deserto para que morresse ali (Lev. 16:21 e 22). Esse bode não era sacrificado, pois não constituía a expiação pelo pecado, mas era punido com a morte de fome e sede no deserto.
D bode para Azazel era símbolo de Satanás.13 Por isso não podia ser sacrificado pelo pecado. Unicamente Cristo é “a propiciação pelos nossos pecados” (I S. João 2:2; 4:10).
Cristo é Sumo Sacerdote no santuário celestial (Heb. 8:1 e 2). Ele aplica ali os méritos de Seu sacrifício aos pecadores arrependidos (Heb. 9:12-15). O santuário celestial também precisa ser purificado como o era o santuário terrestre, figura daquele. He-breus 9:23 diz que “as próprias coisas celestiais” seriam purificadas “com sacrifícios . .. superiores”. Daniel profetizou dizendo: “O santuário será purificado.” Cap. 8:14. O registro dos pecados que Deus mantém no Céu parece ser o que confere impureza ao santuário celestial.
Visto que o Dia da Expiação do santuário terrestre era um serviço de purificação dos registros do pecado do ano todo e de todo o povo de Deus, o Dia da Expiação final ou juízo investigativo deve estar relacionado com uma obra semelhante. Com esta conclusão estamos prontos para considerar o ponto seguinte:
A Obra de Cristo Desde Sua Ascensão
A obra de Cristo desde Sua ascensão abrange duas atividades que correspondem a dois períodos definidos: o primeiro vai desde Sua ascensão até 1844, e o segundo, desde 1844 até Sua segunda vinda em glória. A idéia de duas atividades distintas na obra de Cristo desde Sua ascensão é claramente expressa no parágrafo que segue:
“Depois de Sua ascensão, nosso Salvador iniciaria Sua obra como nosso Sumo Sacerdote. . . . Assim como o ministério de Cristo devia consistir em duas grandes divisões, ocupando cada uma delas um período de tempo e tendo um lugar distinto no santuário celeste, semelhantemente o ministério típico consistia em duas divisões — o serviço diário e o anual — e a cada um deles era dedicado um compartimento do tabernáculo.”14
Desde a Ascensão Até 1844
A obra de Cristo durante esse período era representada no santuário terrestre pelo serviço diário. Isto significa que durante todo esse tempo, Cristo esteve oferecendo perante o Pai, “Seu sangue em favor dos crentes arrependidos”. 15 Cristo esteve aplicando Seus méritos a todos os que se arrependiam, com o objetivo de perdoar-lhes os peca-dos e livrá-los de suas culpas. Era uma obra de perdoar aos pecadores e de libertá-los. O per-dão era e é produzido pelos méritos do sacrifício de Cristo, e a libertação do pecado era e é produzida pela transferência do pe-cado do pecador para Cristo. Tudo isto ocorre no plano do indivíduo e da prática, mas não no plano de Deus e da legalidade. Neste último plano ainda há uma obra a ser realizada, pois “o sangue de Cristo, ao mesmo tempo que livraria da condenação da lei o pecador arrependido, não cancelaria o pecado; este ficaria registrado no santuário até à expiação final”.16
Depois de ascender ao Céu, Cristo entrou no Lugar Santíssimo do santuário celestial (Heb. 9:12) para ser entronizado (Apoc. 3:21) e para inaugurar Seu minis-tério ou dedicar o santuário, assim como Arão entrou no lugar santíssimo do santuário terrestre quando o dedicou e iniciou os serviços nele (Lev. 9:8-22). De-pois continuou Seu trabalho normal no primeiro compartimento. Este ministério consiste em suster Sua Igreja (Apoc. 1:12 e 13), enviar Seu Espírito (Apoc. 4:5; 5:6), interceder em favor dos pecadores (Apoc. 8:3-5).
Desde 1844 Até a Segunda Vinda de Cristo
A obra de Cristo desde 1844 era representada no santuário levítico pelo serviço anual realizado no lugar santíssimo.
Intercessão para perdoar. — É verdade que em 1844 Cristo entrou no Lugar Santíssimo para iniciar a segunda parte de Seu ministério em favor dos pecadores, isto é, o ato de apagar os pecados dos registros celestiais, mas isto não significa que Cristo tenha abandonado Sua obra de perdão e de libertação dos pecadores. Pelo contrário, assim co-mo no Dia da Expiação não cessava o sacrifício contínuo, tampouco, durante o juízo investigativo, cessa Cristo Sua obra de perdoar os pecados. Só que desde 1844 Cristo acrescentou ao ato de perdoar os pecados o ato de apagá-los dos registros. Esta idéia é claramente expressa no seguinte parágrafo:
“Quando, no cerimonial típico, o sumo sacerdote deixava o lugar santo no Dia da Expiação, entrava perante Deus para apresentar o sangue da oferta pelo pecado, em favor de todos os israelitas que verdadeiramente se arrependiam de suas transgressões. Assim Cristo apenas completara uma parte de Sua obra como nosso intercessor para iniciar outra, e ainda pleiteia com Seu sangue, perante o Pai, em favor dos pecadores.”’1
Intercessão para apagar: Obra de Juízo. —O ato de apagar abrange necessariamente uma obra de juízo (Apoc. 5, 14 e 15), pois deve ser determinado quem ou o que será apagado, ou quem ou o que não será apagado. Com isto já estamos dizendo que é apagado: nomes do livro da vida e pecados do livro de memórias.
Os nomes apagados do livro da vida são os daqueles que havendo primeiro aceito a Cristo, depois pecaram e se afastaram dEle, negando-O como sacrifício expiatório. Em Êxodo 32:33 Deus disse a Moisés: “Riscarei do Meu livro todo aquele que pecar contra Mim”; e em Apoc. 3:5 lemos o seguinte: “O vencedor será assim vestido de vestiduras brancas, e de modo nenhum apagarei o seu nome do livro da vida.” Isto significa que quem não vencer será apagado do livro da vida. Em todo caso, para determinar quem alcançou a vitória pelos méritos do sangue derramado por Cristo e quem não a alcançou, é necessário um processo de julgamento, e é isto que constitui o juízo investigativo. Neste juízo Cristo apaga nomes do livro da vida e também pecados do livro de memórias.
Os pecados apagados do livro de memórias são aqueles de que seus autores se arrependeram e receberam o perdão pelos méritos do sacrifício expiatório de Cristo. A Bíblia faz muitas referências ao fato de que os pecados serão apagados. Lemos no Salmo 51:1: “Segundo a multidão das Tuas misericórdias, apaga as minhas transgressões”; e no verso 9 encontra-se a frase: “… e apaga todas as minhas iniqüidades.” Neemias roga a Deus que aos inimigos de Seu povo não lhes seja encoberta a iniqüidade, “e não se risque diante de Ti o seu pe-cado” (Neem. 4:5). Em Isaías 43: 25, Deus Se apresenta dizendo: “Eu, Eu mesmo, sou o que apago as tuas transgressões”, e Pedro roga a seus ouvintes que se arrependam, “para que sejam apagados os vossos pecados” (Atos 3: 19).
Segundo o que dissemos, há uma grande diferença entre o ato de perdoar o pecado e o ato de apagar o pecado. O perdão é algo que pode ser conhecido e experimentado por viva fé no Senhor, o qual elimina o pecado da vida do pecador. O ato de apagar o pecado é um processo legal que elimina o pecado de seu registro e conduz à eliminação final do pecado em si.
Quem é julgado. — Havendo aclarado que a obra do juízo investigativo é essencialmente uma tarefa em que se identifica quais os nomes que devem ser apagados do livro da vida e a quem é aplicada a expiação de Cristo para apagar seus pecados do livro de memórias, precisamos estabelecer agora que pessoas são submetidas a essa espécie de juízo. Tiago White, num artigo publicado na Review and Herald de 29 de janeiro de 1857 e intitulado: “O Juízo”, declarou que no mundo há duas classes de pessoas: os justos e os pecadores, e acrescentou:
“Ambas essas classes serão julgadas antes que ressuscitem dentre os mortos. O juízo investigativo da casa ou igreja de Deus ocorrerá antes da primeira ressurreição, e o juízo dos ímpios ocorrerá durante os mil anos de Apocalipse 20, e eles serão ressuscitados no fim desse período. . . . O juízo dos justos é realizado enquanto Jesus oferece Seu sangue para apagar-lhes os peca-dos.”’8
Segundo Tiago White, as pessoas julgadas no juízo investigativo são os justos ou a igreja de Deus, visto que os ímpios serão submetidos a julgamento durante os mil anos. Esta idéia se harmoniza perfeitamente com o que foi declarado por Ellen G. White:
“Assim, no grande Dia da Expiação final e do juízo de investigação, os únicos casos a serem considerados são os do povo professo de Deus. O julgamento dos ímpios constitui obra distinta e separada, e ocorre em ocasião posterior. ‘E tempo que comece o julgamento pela casa de Deus; e, se primeiro começa por nós, qual será o fim daqueles que são desobedientes ao evangelho?’”19
Podemos inferir, portanto, que no juízo investigativo somente são consideradas as vidas dos filhos de Deus que viveram através dos séculos e cujos nomes se encontram no livro da vida. Mas não só dos que estão mortos, mas também dos que estão vivos. Paulo disse a Timóteo: “Os pecados de alguns homens são manifestos precedendo o juízo; e em alguns manifestam-se depois.” I Tim. 5:24, Almeida, antiga. “Isto é, alguns homens revelam ou confessam seus pecados e vão a juízo enquanto o sangue de Cristo pode apagá-los e os pecados podem ser olvidados; ao passo que os peca-dos não confessados, pelos quais não houve arrependimento, continuarão a existir e deporão contra o pecador no grande dia do juízo de mil anos.”20
Quando serão julgados os vivos? — Se no juízo investigativo também serão julgados os justos vivos, perguntamos imediatamente: Quando começa o juízo dos vivos?
A primeira resposta a esta pergunta é: Perto do fim do juízo investigativo. Assim o diz Ellen G. White, ao escrever: “Começando pelos que primeiro viveram na Terra, nosso Advogado apresenta os casos de cada geração sucessiva, finalizando com os vivos. ”21 Todavia, não se saberá quando esse juízo houver terminado. É o que declaram estas palavras:
“Quando se encerrar a obra do juízo de investigação, o destino de todos terá sido decidido, ou para a vida, ou para a mor-te. . . . Os justos e os ímpios estarão ainda a viver sobre a Terra em seu estado mortal: estarão os homens a plantar e a construir, comendo e bebendo, todos inconscientes de que a decisão final, irrevogável, foi pronunciada no santuário celestial. ”22
Quanto à data em que terá início o juízo dos vivos, podemos inferir, portanto, que a única coisa que sabemos é que os justos vivos são os últimos a ser julgados. Não se sabe quando se iniciará o juízo dos vivos, nem quando terminará. O que sabemos com toda a certeza é que no fim do juízo investigativo serão apagados dos livros de registros os pecados dos que perseveraram até o fim, e os nomes de todos os outros — os que não perseveraram até o fim — serão eliminados do livro da vida (Êxo. 32:32 e 33; Apoc. 3:4; 20:12 e 15; 22:19).
Qual é a norma do juízo?— Na passagem da primeira Epístola de Pedro, onde ele faz alusão ao juízo investigativo, isto é, ao juízo que começa “pela casa de Deus” (Cap. 4:17), depois de afirmar que “o fim de todas as coisas está próximo” (Cap. 4:7) e após declarar que Deus “é competente para julgar vivos e mortos” (Cap. 4:5), ele assevera: “Se alguém falar, fale segundo as palavras de Deus.” Cap. 4:11, Almeida, antiga. Esta é a norma de conduta dos que estão inteirados de que o juízo começa por eles, porque fazem parte da “casa de Deus”. A norma é expressa na frase: “as palavras de Deus” — Lógia theou, diz o texto grego.
Que são estas lógia? Que espécie de palavras são estas? Sem dúvida, têm que ser palavras proferidas por Deus em forma de normas de conduta, visto que em todo o contexto do juízo no qual Pedro as pronuncia elas têm necessariamente esse caráter. A mesma palavra lógia é empregada por Estêvão em sua defesa perante o Sinédrio. Disse ele: “É este Moisés quem esteve na congregação no deserto, com o Anjo que lhe falava no monte Sinai, e com os nossos pais; o qual recebeu palavras [lógia] vivas para no-las transmitir. A quem nos-sos pais não quiseram obedecer. ” Atos 7:38 e 39. Gehard Kittel, em seu famoso dicionário teológico, comentando o significado deste texto, diz que ele “se refere claramente à revelação do V.T. no Sinai, especialmente à Torah (ou ao Decálogo), o qual foi recebido por Moisés.”23
As lógia mencionadas por Pedro como norma de conduta que devemos observar ao preparar-nos para o juízo de Deus são as mesmas lógia que Estêvão disse terem sido recebidas por Moisés no Sinai, isto é, “as Dez Palavras”, o Decálogo ou Lei Moral. Este Decálogo é a norma de conduta do juízo investigativo.
Síntese da Doutrina Adventista do Juízo Investigativo
Esta síntese da doutrina adventista do juízo investigativo é extraída do livro O Grande Conflito e se encontra na SDA Encyclopedia, sob o título “lnvestigative Judgment”:
- 1. A obra do juízo investigativo e o ato de apagar os pecados serão cumpridos antes da Segunda Vinda de Cristo.
- 2. Cristo Se dirige ao Ancião de Dias, no Céu, no fim dos 2.300 dias em 1844. Nosso grande Sumo Sacerdote entra no Lugar Santíssimo e comparece ali à presença de Deus para empenhar-Se no último ato de Seu minis-tério em favor dos homens: a execução do Juízo Investigativo.
- 3. Jesus Se apresenta como Advogado de Seu povo para rogai por ele diante de Deus.
- 4. No grande Dia da Expiação final e Juízo Investigativo, os únicos casos considerados são os do professo povo de Deus.
- 5. Começando com os que primeiro viveram na Terra, nosso Advogado apresenta os casos de cada geração sucessiva, finalizando com os vivos.
- 6. Cada obra do homem é apresentada diante de Deus e registrada como ato de fidelidade ou infidelidade.
- 7. Os livros de registros do Céu, nos quais estão registrados os nomes e as obras dos seres humanos, determinarão a decisão do juízo.
- 8. A lei de Deus é a norma pela qual o caráter e a vida dos ho-mens serão julgados no juízo.
- 9. Todos os que verdadeiramente se tenham arrependido do pecado e que pela fé reivindicaram o sangue de Cristo como seu sacrifício expiatório terão o per-dão aposto a seus nomes, nos livros do Céu. Tornando-se eles participantes da justiça de Cristo, e verificando-se estar o seu cará-ter em harmonia com a lei de Deus, seus pecados serão riscados e eles próprios havidos por dignos da vida eterna.
- 10. Quando alguém tem pecados que permaneçam nos livros de registro, para os quais não houve arrependimento nem per-dão, seu nome será omitido do livro da vida, e o relato de suas boas ações apagado do livro memorial de Deus.
A obra do sacrifício diário era uma obra de reconciliação em prol do homem pecador. Seu pecado era perdoado.
- 11. Quando terminar a obra do Juízo Investigativo, o destino de todos terá sido decidido, ou para a vida, ou para a morte.
- 12. Quando se encerrar o Juízo Investigativo, Cristo virá e com Ele estará a Sua recompensa para retribuir a cada um segundo as suas obras.
V. Conclusão
À guisa de conclusão deste estudo sobre a obra de Cristo no Juízo Investigativo, mencionaremos os seguintes pontos:
- 1. A obra específica que Cristo está desempenhando no Juízo Investigativo está relacionada com os santos que têm existido em toda a história do mundo, desde Adão. Esta obra de julgamento nada tem que ver com os ímpios, os quais serão julgados durante os mil anos de Apocalipse 20.
- 2. O Juízo Investigativo é uma obra de intercessão semelhante à que o sumo sacerdote realizava no Lugar Santíssimo, no Dia da Expiação. Seu objetivo é determinar quem permanecerá no livro da vida e quem não, o que é decidido verificando quais as pessoas cujos pecados foram apagados do livro de memórias porque aceitaram o sangue expiatório de Cristo na cruz.
- 3. A principal obra de Cristo durante o Juízo Investigativo é, portanto, o ato de apagar os pecados dos que perseveraram até o fim, permanecendo sob os méritos do sangue de Cristo até o último dia de sua existência.
- 4. A atividade de Cristo em apagar os pecados dos registros não exclui Sua intercessão para perdão dos pecadores, que no santuário era representada pelo serviço diário, pois Cristo continua perdoando pecados e o fará até o momento de pronunciar o decreto final de Apocalipse 22:11.
- 5. A eliminação final do pecado de sobre a Terra será realizada quando Cristo exigir de Satanás o pagamento de sua responsabilidade na existência do pecado. Assim como o bode para Azazel era punido pela morte no deserto, Satanás será punido no fim, porque como instigador do pe-cado de cada indivíduo e como originador do pecado no Universo, tem uma responsabilidade cuja culpa Cristo não expiou na cruz. Cristo só expiou a parte da responsabilidade e culpabilidade que o homem tem no peca-do, e isto é especialmente real no caso daqueles que O aceitaram e que pelo arrependimento obtiveram o perdão pelos méritos do sangue de Cristo.
- 6. Quando se encerrar o Juízo Investigativo, depois de haver decidido os casos de todos os justos, começando pelos mortos e terminando pelos vivos, Cristo terá apagado todos os pecados de Seus filhos dos registros celestiais, e em virtude dessa obra eles ficarão diante de Deus como se nunca houvessem pecado, prontos para ir viver com Ele para sempre no Reino eterno que Cristo Jesus estabelecerá de acordo com Suas promessas.
Bibliografia
- 1. SDA Encyclopedia, pág. 600.
- 2. Ibidem.
- 3. Ellen G. White, O Grande Conflito, pág. 488.
- 4. Ibidem.
- 5. Idem, págs. 488 e 489.
- 6. The Interpreter’s Dictionary of the Bible, vol. 4, pág. 147.
- 7. Robert B. Girdlstone, Synonyms of the Old Testament, pág. 134.
- 8. Ellen G. White, Patriarcas e Profetas, pág. 366.
- 9. Ellen G. White, O Grande Conflito, pág. 480.
- 10. Idem, pág. 481.
- 11. Idem, pág. 486.
- 12. Ellen G. White, Patriarcas e Profetas, pág. 367.
- 13. Idem, pág. 371.
- 14. Idem, pág. 370.
- 15. Ibidem.
- 16. Ibidem.
- 17. Ellen G. White, Cristo em Seu Santuário, pág. 102.
- 18. “The Judgment”, Review and Herald, 9:100 (29-1-1857).
- 19. Ellen G. White, O Grande Conflito, pág. 480.
- 20. Tiago White, Review and Herald, 9:100 (29-1-1857).
- 21. Ellen G. White, O Grande Conflito, pág.
- 22. Idem, pág. 490.
- 23. Theological Dictionary of New Testament, vol. 4, pág. 138.